quarta-feira, 29 de novembro de 2006

A FELICIDADE

Com força e com vontade
A felicidade há de se espalhar

Há de mudar os homens
Antes que a chama apague
Antes que a fé se acabe
Antes que seja tarde.

(Ivan Lins e Vitor Martins)

Esta semana fui surpreendida por uma indagação curiosa. Um amigo especial queria saber com que livros fiz minha receita de felicidade. Isto porque quando nos conhecemos, afirmei que me considero uma pessoa feliz. Haverá receita de felicidade?

Refleti um tiquinho sobre o meu sentido de felicidade. Acho que qualquer coisa que eu diga vai soar muito clichê. O fato é que, sendo ''clichê'' ou sendo acadêmica, a noção de felicidade passa pela noção de amor, portanto, farei uma viagem indo do teórico ao empírico, e quem quiser que conte outra.

Falar de felicidade é lembrar de Ortega y Gasset, filósofo espanhol do século XX. Acho fantástico como ele coloca o amor no centro das coisas, como mola propulsora. Acho interessante o seu ''eu sou eu e minhas circunstâncias'', que eu diria ''eu e minhas possibilidades''.

Falando em possibilidades, não poderia deixar de citar o ótimo documentário, que assisti recentemente: ''Quem somos nós?'' Afinal, é ciência - portanto ainda estamos na academia - física quântica, a física das possibilidades e a nossa capacidade de criar realidade. O meu sentido de felicidade passa pela idéia de escolha, de optar por criar a felicidade dentro e em torno de mim.

Mesmo não sendo afeta a livros de auto-ajuda ou fórmulas prontas, citaria algumas frases, que embora bastante clichês – não há como fugir - são verdadeiros ''mantras sagrados'' no caminho da felicidade que criei para mim. Ei-las:

1. A dor sempre vai existir, o sofrimento é opcional; Eu escolhi aceitar a dor, quando inevitável, mas escolhi também não sofrer. Como diria Roberto Shinyashiki, ''Ter problemas é normal, ser derrotado por eles é opcional''.

2. A felicidade depende exclusivamente de mim, de mais ninguém.

Essa é uma de minhas prediletas, porque realmente acredito que nossa felicidade afetiva não está nas mãos de outra pessoa, seja amigo, namorado, marido, seja quem for. A responsabilidade por nossa felicidade está em nossas mãos. Não é justo transferí-la para os ombros de outro.

3. Sou responsável por minha vida, por minhas escolhas, por meus sentimentos e por meu comportamento diante da vida. Só posso mudar a mim mesmo. Mudar a mim mesmo é escolher mudar minha atitude diante da vida, e isso já é um passo bem grande (e difícil).

Aqui vale uma observação: Sou dona das minhas ações, das minhas escolhas, mas não sou Deus. Isto significa que não tenho o controle de tudo a minha volta, ao contrário, tenho governabilidade sobre nada, salvo minha forma de reagir aos fatos. Isto é muito importante, ajuda a evitar a ansiedade. Tendo feito minha parte, aguardo os acontecimentos.

4. Ninguém dá aquilo que não tem. Amar-se é fundamental, só então posso realmente amar outra pessoa.

5. Sou minha melhor companhia. Se eu não me acho uma boa companhia, como posso esperar que os outros gostem de estar comigo?

6. Faço coisas inéditas, extraordinárias, ao menos uma vez por ano.

Resolvi fazer coisas extraordinárias no Reveillon de 2003. Decidi que no Reveillon de 2004, em lugar de estar na frente da TV assistindo a queima de fogos no Rio, eu correria a São Silvestre. Preparei-me durante todo o ano de 2004, e no dia 31 de dezembro, lá estava eu – uma ex-sedentária – correndo os 15km do percurso da 80ª São Silvestre. Cruzei a linha de chegada, depois de 1h53min da largada, exausta, na presença de milhares de pessoas que aplaudiam os grandes vencedores daquela prova. E entre eles, estava eu, que venci minhas próprias limitações. Acreditei, investi e realizei algo extraordinário. Dali em diante tenho feito isso sempre, ao menos uma vez por ano realizo algo inédito em minha vida.

5. Auxiliar os outros é uma grande forma de ser feliz. Vale a pena experimentar.

O que mais posso dizer? Não sei, sinceramente sou Maria Cláudia, não sou Dalai Lama. Não sou perfeita, estou longe disso. Ainda tenho um longo caminho a percorrer. Estou percorrendo o caminho, ''porque o caminho só existe quando a gente passa''.

''Acho que a 1ª vez que nos falamos, você disse que era feliz.''(Um amigo, 20 de novembro de 2006).

"Felicidade não é uma meta, mas um estado de espírito". "Ela é feita de pequenas coisas". (Roberto Shinyashiki)



Maria Claudia Cabral

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Caminhada



Das privações que a vida pode impor ao ser humano, creio que a incapacidade de andar é uma das piores. Depender de alguém ou de algo, além das próprias pernas, para locomover-se fisicamente nesse mundo que parece não ter fim é avistar um fim de perto: o olhar facilmente se perde quando não se pode mais andar para fingir ou concluir que ainda se tem muito chão para vislumbrar. Mas, penso comigo, que talvez o incapacitado seja aquele que tem pernas e não as usa: tem fôlego e não age, pensando que o pôr-do-sol finda qualquer resquício de esperança, mesmo que de fato não exista.

Por isso, ou por nada, vi a necessidade de transformar em poesia o andar nosso de cada dia e todas as suas farpas adquiridas ao longo do caminho; ou pelo menos uma tentativa, pois para o bom brasileiro, ou não, talvez o melhor slogan seja caminhar é preciso, pelos olhos de outros poetas: os de nós mesmos.

Caminhada

Hoje eu aprendi o significado do “caminhar para espairecer”

Que sempre me disseram entre rugas,

Mas nunca pude compreender.

Porque minhas pernas inquietas, chatas e estranhas

Não conseguem mais suportar toda a angústia

De quem pouco tem a ansiar ou desistir.

Pois eu sei, mais do que meus próprios ossos,

Que andar é negociar com os sentimentos,

E eu ando.

Então descobri, que além de escrever

Pra estragar e consertar,

Posso caminhar e respirar o orvalho.

Então direi aos interessados

Que as lágrimas vieram da madrugada,

Das pessoas que entoavam preces nas esquinas,

E das que paravam em fila dupla pra fumar um cigarro.

E eu que não sabia que às vezes é preciso parar...

Eu cantei e esqueci que o dia veio

Pra que eu pudesse ver claramente a realidade.

Deitei e esperei a noite chegar

Pra sonhar aquilo que eu não consegui ver.

Insista, me disseram, nesse eterno espairecer.

Ontem eu insisti, e por volta das 20 horas eu morri.

Volto inadequada, insana e veloz pra lhe dizer

Que não dura, aqui, a hipocrisia,

Pois ela é cansativamente esmiuçada em segredo.

Ordem, calma e regresso.

No outro dia é preciso acompanhar a volta,

Mesmo que tardiamente:

Já que nem mesmo no caos eu me acho

Devido à minha incapacidade de lidar com o incoerente.

Maria Clara Dunck.

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A representação dos negros nos quadrinhos

Pensar os quadrinhos no Brasil, bem como a questão racial no país, é uma tarefa complexa e delicada, sempre margeada pela problemática da exclusão e consubstanciada pela indiferença. No âmbito da discussão racial a problemática toma contornos maiores, tocando questões como direitos humanos, transformação e redimensionamento histórico das formas de preconceito, a apropriação simbólica de um grupo, o negro, pelo outro, o branco – esse outro portador dos meios e canais de difusão comunicacional – capaz de construir hegemonicamente não somente o discurso sobre si mesmo e demais grupos, mas apropriar-se da realidade social e histórica, redimensionando-a para criar simbolicamente um universo moldado pelo seu olhar.

Em relação aos quadrinhos, a questão da marginalidade, menor em dimensões pragmáticas, mas também importante nos limites desse editorial, configura-se igualmente no universo da apropriação discursiva: as mídias surgidas em fins do século XIX e difundidas durante o século XX são vistas pela maioria como instrumentos de massificação, moldadas dentro da lógica da utilidade econômica, diluídas em termos de profundidade teórica e submetidas ao compromisso com a lógica do prazer demandada pelo capital, em detrimento do compromisso com o conhecimento. Essa visão academicista e textualista sofreu transformações à partir da década de 70, com o advento da semiótica. Á partir daí, a imagem alcançou novo patamar na compreensão dos processos da produção de sentido, antes limitada à análise do texto.

O binômio quadrinhos e representação do negro pode ser bem percebido no Brasil em Ziraldo e Maurício de Souza. Maiores produtores de quadrinhos no país desde a década de 70, conseguiram superar as sérias restrições a quem tenta sobreviver de HQ's por aqui, criando universos significacionais de relações extremamente complexas. No primeiro, destacam-se as histórias da Turma do Pererê, publicadas à partir de 1960. Do segundo, a Turma da Mônica, de 1970.

A Turma do Pererê é um universo mitológico criado por Ziraldo, claramente ancorado no nacionalismo modernista. Herdeiro da tradição lobatiana, também influenciado por outros nomes do modernismo – a exemplo de Mário de Andrade – o autor foi capaz de discutir a realidade nacional de forma extremamente crítica através de um universo lúdico infantil, protagonizado por Saci-Pererê, mito do folclore brasileiro redimensionado pelo autor e inserido em um universo cujo epicentro espacial é a Mata do Fundão. Aí, Pererê convive com um grupo composto por duas negras (além do próprio Pererê), Boneca-de-Piche e Mãe Docelina e dois Índios, Tuiuiú e Tininim, além de um grande grupo de animais típicos da fauna brasileira humanizados e batizados com nomes como Moacir (jabuti), Galileu (onça) e Alan (macaco). Os dois brancos presentes no núcleo principal de personagens, o caçador de onças Compadre Tonico e seu companheiro Sêo Neném, são dimensionados com características típicas de vilania, apresentando-se como antagonistas no universo em questão.

A Turma da Mônica de Maurício de Souza, universo quadrinizado mais popular do país, apresenta características bastante distintas da realidade forjada por Ziraldo. As quatro personagens principais, Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão, são construídas através de estereótipos e características muito bem definidas, de onde é extraído o humor nas tiras. A primeira, dentuça e com enorme força física, sempre carrega um coelho de pelúcia azul. È freqüentemente almejada por planos infalíveis que sempre falham de Cascão e Cebolinha, o primeiro com aversão a água, o segundo, troca a letra R pela letra L ao falar. Magali, companheira de Mônica, tem um apetite voraz e insaciável, sem, com isso, engordar. A habilidade com que Maurício constrói estórias baseadas nos estereótipos supracitados é notável.

Além das personagens centrais, destaca-se ainda um enorme núcleo de personagens secundárias, acionadas em momentos muito específicos, normalmente quando é necessário para a história formar grandes grupos. Servem, portanto, como um universo de reserva. Nesse núcleo secundário, encontram-se diversas personagens que se encaixam no que podemos chamar de minorias: O mudo Humberto, o japonês Nimbus, os negros Jeremias e Pelezinho (esse já não publicado), a deficiente visual Dorinha e o cadeirante Luca, estas, personagens recentes.

O que se vê portanto, é uma configuração base seguida por Ziraldo e Maurício de Souza, centrada na utilização de um núcleo central de protagonistas que atua como agente causal. Entretanto, Ziraldo, ao fazer a Turma do Pererê, tomou o cuidado de adequar suas personagens à realidade étnica do país, enquanto Maurício de Souza fez justamente o contrário. As minorias de Maurício de Souza são mera propaganda social, enquanto a turma do Pererê assume contornos muito maiores. Jeremias só é utilizado quando são necessárias personagens secundárias que dêem continuidade à cadeia de acontecimentos da trama. A função dele na Turma da Mônica, nesse sentido, é muito precisa: ser negro. Ele não tem nenhuma característica destacada ou excentricidade como as outras personagens, serve somente para o autor se mostrar politicamente correto. Obviamente, isto não deve ocorrer de maneira proposital. Entretanto, é mais uma daquelas lacunas quase imperceptíveis, involuntárias e mesmo inocentes, em que percebemos que a problemática do racismo e da exclusão está muito longe de seu fim.

Cesar Henrique Guazelli.

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terça-feira, 21 de novembro de 2006

Editorial nº 05: Para discutirmos....


Diariamente somos surpreendidos com acontecimentos que nos levam a pensar, a refletir e a discutir nossa realidade.... A quinta edição da Arca Mundo discute.....

sobre cinema de ação, sobre amores e descobertas, sobre arte, sobre liberdades...

Não só descobrimos as liberdades que a Internet nos proporciona, como também fomos descobertos. Amanhã (22/11) será votado um projeto de lei que controla o acesso de todos os brasileiros à Internet. Foi lançada a enquete: e você? O que pensa sobre isso?

O que eu espero, companheiros, é que depois de um longo período de discussão, todos concordem comigo!” Winston Churchill

P.S: Gostaríamos de parabenizar de maneira pública e solene, nosso colaborador Paulo Henrique dos Santos, pela exibição de seu primeiro documentário, Além dos Outdoors!!! Um filho que finalmente nasceu e só tem a dar mais e mais frutos!!!

Camila Pessoa.

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A Menina e o Gato.


...Era uma vez, num reino muito distante, uma Menina levada e inteligente. Ela sabia de tudo e sobre tudo perguntava. Se alguém sentava ao seu lado, ela logo indagava o nome, a profissão, a cor favorita. Tão esperta a menina, que ninguém resistia a uma boa prosa com ela.

Um dia a Menina viu um gato. Ela nunca havia tomado contato com gatos. Ficou tão curiosa, tão intrigada. Interessou-se imediatamente por compreender o gato. Queria conhecer o que é um gato. Aproximou-se devagar, num misto de vontade e receio. Os gatos mordem? Eles podem machucar? - perguntava a criança a si mesma

O gato a olhava fixamente, parecia adivinhar suas intenções. Observador e cauteloso, o gato a olhava. Ela sorria, gostava da idéia de entender o gato, se é que é possível entender gatos.

Ela se moveu lentamente em direção ao gato, foi estendendo sua mãozinha pequena e curiosa. O gato a olhava. Ele se aproximou um pouco mais, parecia também querer conhecer a criança. O gato conhecia meninas, mas talvez – nunca se sabe o que passa na cabeça de um gato – quisesse saber sobre cada menina. Quis, talvez, conhecer essa Menina. Quem sabe?

Tranqüilamente ele se aproximou um pouco mais. A Menina, não entendendo o gato, com olhos fixos, retrocedeu um tiquinho, mas ela queria muito desvendar o mistério do gato. Então, aproximou-se só um pouquinho. Ele permaneceu.

O gato aproximou-se um pouco mais. Ele chegou a tocá-la, ela saltou e soltou um gritinho – misto de susto e de alegria – por sentir finalmente o gato na ponta dos dedos. Ele assustou-se, recuou.
Ela já não era mais a mesma menina, havia tocado o gato, embora não entendesse um gato. Queria tocá-lo novamente, queria sentir um pouco mais sua textura, seu cheiro, se pudesse, queria provar seu gosto! Queria saber o gato, como saber um gato?

Foi então que, cuidadosamente, aproximou-se de novo – pulsavam, ainda e mais, o medo e a vontade de sabê-lo. A Menina lançou-se em direção ao gato. Ele, imediatamente, ronronou algo que ela não pôde compreender. Ela assustou-se. Ficou ali parada sem entender. Olhinhos fixos no gato. E o gato, olhos fixos nela, virou-se e lentamente saiu. Ela chamou o gato e ele a olhou com desdém.

A Menina até aquele momento não conhecia tal indelicadeza e não entendia o que havia feito de errado. Não quis mais brincar com gato. Também virou-se e saiu batendo pés, olhinhos marejados por causa do gato-bobo. Humpf...

Sua mãe tentou, sem sucesso, explicar-lhe que gatos são assim mesmo, arredios às vezes, mas são muito boas companhias. Disse que ela devia rir da reação do gato, porque quando um gato permite que uma menina o conheça e presta-se a conhecer a Menina, são os melhores amigos de tooodo o mundo. Seu pai, por outro lado, dizia: - Esqueça esse gato, minha filha, ele é só mais um gato-bobo. Que tal brincar de outra coisa. Há tantas outras coisas interessantes no mundo, porque você cismou com esse gato?

A criança teimosa continuava lá, tentando saber o gato.

'' Desarme-se. Amar faz bem para a alma, para a pele e para o cabelo.'' (Uma jornalista, em 17 de novembro de 2006).

'' O que é amar?'' (A criança, hoje e sempre)

Maria Claudia Cabral.

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Na tentativa de controlar

Projeto de lei no Senado prevê controle da Web brasileira

O Senado brasileiro discute na quarta-feira, em reunião da Comissão
de Constituição e Justiça, um projeto de lei que prevê o controle do
acesso à internet, a exemplo do que se pretende estabelecer na China,
um dos países que mais controla o uso da rede.

Conforme o projeto, cujo relator é o senador Eduardo Azeredo, do PSDB
de Minas Gerais, qualquer usuário precisaria se identificar quando
acessasse a internet ou qualquer outra aplicação como o acesso a e-
mail ou a criação de blogs.

Dessa forma seria possível monitorar precisamente o que cada usuário
faz quando está online, sabendo que sites visita ou que tipo de
arquivos está baixando da rede, como músicas ou filmes.


Além de extinguir a privacidade, o projeto prevê fazer do acesso não
identificado crime passível de reclusão de dois a quatro anos.
Provedores de acesso ficariam responsáveis pela veracidade dos dados
cadastrais dos usuários e seriam sujeitos às mesmas penalidades.

Dados cadastrais

Para obter o acesso à internet, os usuários precisariam fornecer
dados pessoais comprovados como nome completo, endereço, número de
telefone, RG, e CPF aos provedores de acesso.

A favor do projeto estariam administradoras de cartões de crédito e
bancos. Procurada pela reportagem, no entanto, a assessoria de
comunicação da Febraban - Federação Brasileira dos Bancos, afirmou
que não irá comentar o projeto por enquanto.

Os provedores de internet são contrários à medida, que estabeleceria
um novo encargo burocrático para os provedores. Analistas também
criticaram a justificativa do projeto, de extinguir a privacidade dos
internautas brasileiros, já que suspeitos de crimes digitais podem
ser rastreados e identificados por meio do seu endereço IP (internet
protocol), número que é atribuído a cada usuário no momento em que
ele acessa a internet.

Agência Estado de Notícias

Discutamos, portanto, a noção de liberdade, de comunicação independente que colocamos em debate com a criação da Arca Mundo. Um dos maiores motivos pelo qual buscamos a Internet para a publicação de nossos pensamentos, foi, justamente, a não necessidade de patrocínios, financiamentos, ligações políticas, censuras, limites... É claro que essa ausência de limites é, ao mesmo tempo aliada a “causas” como a nossa e a pessoas que praticam crimes como rackers e pedófilos. Uma das grandes conseqüências inevitáveis do mal estar na civiliazação: tudo o que é novo, útil, acaba sendo subvertido de todas as formas, para todos os fins.

O fato é que os grandes monopólios de comunicação, aliados às formas de governo sempre tiveram o controle absoluto dos registros de informação, do que é colocado em pauta na sociedade, e agora, de alguma forma, isso está sendo corrompido, impedido. Longe de mim pintar as empresas eios im pintar como grandes viltoa todos os fins.como grandes vilãs ou colocar a culpa “no sistema”. Acontece, que um dos últimos meios livres, novamente, está na iminência do controle. É legal que seu sigilo telefônico ou bancário seja violado ou controlado diariamente? Por que seria legal, portanto, que seu acesso à Internet o seja? Deve-se, sim, procurar uma saída que evite os crimes cometidos via web, e todos sabem que não é essa necessariamente. Como na ditadura, as censuras foram estabelecidas para nos salvar da ameaça comunista, agora, querem nos controlar, para nos salvar da ameaça online. Sim, é um exemplo extremista, mas por que não sermos exagerados agora?imes cometidos via web, e todos sabem que ns do Mal Estar na Civiliazaraticam crimes como rackers e ped

Posso estar fazendo um alarme trivial, mas a maioria esmagadora da sociedade, simplesmente não sabe como o seu direito de comunicar e de receber informações é violado diariamente, sem que ninguém perceba. Alguém, alguma vez, pensou que poderia reclamar à Globo pela porcaria dos filmes ridículos e repetidos que passam, no mínimo, cinco vezes por ano em sua programação? Ou questionar por que os jogos de futebol são comprados para serem exibidos sempre depois da porcaria da novela das nove, fazendo com que você vá dormir de madrugada, se quiser comparecer ao estádio na quarta feira? Alguém se interessou ou buscou pesquisar qual seria o melhor plano de tv digital para a sociedade? Alguém se manifestou a favor do diploma para os jornalistas, quando queriam abolir sua necessidade para o exercício da profissão? As pessoas simplesmente acompanham passivamente o que acontece, sem ter a noção de que a cada dia são mais podadas e impedidas de se expressar!

Sejamos todos a favor de maneiras que impeçam atitudes criminosas, mas que não limitem mais esse meio de comunicação. Não sabemos no que isso vai dar, mas declaro aqui a minha indignação!

Camila Pessoa.

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Decifrador de sonhos


Não há motivos coerentes pra avivar os gestos frágeis

Do ser que se vê passional mas se faz cego aos apelos dos sonhos.

Engraçado como é indiferente seus atos falhos e seu pobre caráter

Frente a uma palavra que confessa a todos o que não precisa a mim dizer...

A mecha de cabelo que interrompe nossos olhares sinceros

Mente ao solidificar na ausência a espera de um sinal augusto:

Todas as mortalhas sabem que a minha busca é pelo que me abala

Nas gigantes manhãs em que nada se dá ao sol que o acordar de bem.

Sempre cri no talvez, o odiando mais que amar a quem se idealiza...

De alguém que, conscientemente nunca amou,

Forjado nesse mundo de esperas e de pestes loucas e verossímeis:

A minha quase inquietação se metadiza pois é vã na morte e na vida.


Maria Clara Dunck.

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O Cinema de Ação em cinco filmes


- O Casal Osterman, de Sam Peckinpah

- Bala na Cabeça, de John Woo

- Sonatine, de Takeshi Kitano

- Eleição, de Johnnie To

- Miami Vice, de Michael Mann

São cinco filmes em questão, e quatro deles giram em torno de um. Não por um motivo qualquer, O Casal Osterman de Sam Peckinpah, é o filme base para uma reflexão maior sobre o cinema de ação contemporâneo, pois é dele que vem a rica fonte de influências que se estruturaram para a criação desse gênero que hoje é cultuado por muitos, e tem cineastas de primeira linha como representantes. Peckinpah é mesmo o maestro da ação e da violência, por que ele simplesmente enxergou no registro cru e em slow motion da violência, uma vertente bem mais profunda, e que poderia dar ao gênero uma maior austeridade e possibilidade de reflexão do mundo em que vivemos bem maior do que o cinema vinha fazendo até então. Em O Casal Osterman, Peckinpah coloca um casal as voltas com agentes soviéticos disfarçados, nesse que é um filme de espionagem com a ação sendo construída aos poucos. Ou seja, O Casal Osterman é um filme de ação, e não um filme com cenas de ação, certo de que ação não diz respeito apenas às seqüências de luta, tiroteios, explosões (ainda que tudo esteja lá). Peckinpah irá antes de qualquer outra coisa, priorizar o cinema, o homem, e a selvageria inerente a ele.

De Peckinpah passamos a John Woo, especificamente de sua fase chinesa em meados da década de oitenta. Woo surgia como a grande revelação do cinema de ação quando fez Money Talk em 1980, e depois dele, fez ao menos três filmes memoráveis como The Killer, Bala na Cabeça e A Outra Face. Fato é que a fase criativa de Woo termina, a partir do momento em que ele adere ao cinema de ação conservador americano, diluindo bastante a fórmula que fez dele um mestre na China. Em Bala na Cabeça, Woo reúne o estilo operístico de um Sergio Leone com a violência crua a lá Peckinpah, para criar uma sinfonia da brutalidade e da guerra, num filme que se as vezes se leva a sério (mas sempre nos momentos certos) em outras, injeta humor e ironia pra colocar o gênero da “ação” num patamar que vai além da simples diversão como nos filmes do Michael Bay, por exemplo. Um elogio ao espetáculo do caos, do sangue, da violência, mas nunca simplesmente da violência pela violência. Woo aqui, não soará gratuito. A violência brutal, é antes ferramenta para a não-violência, e em Bala na Cabeça, a idéia é exatamente essa.

Eis que surge então Sonatine, de Takeshi Kitano. Kitano não é um reciclador do cinema clássico de ação como bem foi John Woo. Ele opta por uma outra abordagem do gênero, abordagem essa que mais tarde irá se tornar a marca desse que é um dos grandes autores do cinema contemporâneo. Sonatine é o anti-filme-de-ação por excelência. Primeiro por que todos os códigos do gênero estão lá: tiroteios, explosões, pancadaria, humor, máfia, gangues e tudo mais. Mas Kitano opta pelo existencialismo antes de tudo. O minimalismo, o tempo, os pequenos momentos, são valorizados antes da ação. É ai que ele se aproxima de Peckinpah, pois ambos querem abordar o ser-humano antes de qualquer outra coisa, e a violência é apenas um reflexo, uma faísca. Mas se Peckinpah primava pelo balé, pelo espetáculo da violência, Kitano prima pela frieza. A violência aqui vem crua e simples, sem qualquer outro artifício. Mas Kitano faz com Sonatine – e também com seu próximo filme, Hana-bi – um filme de ação visceral e contemplativo. Uma gratificante obra-prima.

Voltando ao presente, hoje temos Johnnie To como o maior expoente desse gênero no cinema contemporâneo. To volta a levar a ação para o lado operístico da coisa, das lutas coreografadas, do sangue aos borbotões. Mas ele, unindo o que havia de melhor em Leone e Peckinpah, criou uma assinatura sua. Em Assassinos de Elite ele demonstra por exemplo, com a metalinguagem, de onde veio tudo o que conhecemos hoje sobre o cinema de ação. E aqui ele consegue trazer Sergio Leone de volta à vida com a orquestração perfeita da ação e da violência em seu filme. Desde o uso das gruas, das frases de efeito e tudo o mais. Mas To quer fazer um cinema só seu. É ai que ele chega então com Eleição. Filme de ação por excelência, Eleição retoma a idéia das pequenas ações, para um grande filme de ação. Lá não há a carnificina referencial de Assassinos de Elite, mas sim uma serenidade na colocação de violência em cena. O que To quer antes é dissecar a relação dos personagens, num jogo complexo, pra depois nos revelar o espetáculo da violência, que surge em poucas cenas, mas não menos que impressionantes. Election é parte de uma trilogia que To vem criando (a segunda parte já foi lançada) buscando reestruturar o olhar diante dos gêneros, reciclando códigos já batidos e criando os seus próprios. Por isso, marquem bem esse nome: Johnnie To.

Retornamos então à América, criadora do cinema de ação, mas estagnada, presa em seus próprios signos do gênero. Hollywood que enriqueceu com o filão do cinema de ação que ela mesma criou, teve que importar os diretores orientais que renovavam o gênero pra se manter. Mas a grande revolução dentro do gênero veio de um americano nato: Michael Mann. Ele depois de filmes de ação mais clássicos como Fogo Contra Fogo, começa a partir de Colateral, uma experiência radical dentro do cinema de ação. Essa radicalização chega ao ápice em Miami Vice, filme assumidamente de ação, mas que na sua subversão ainda injeta doses fortes de romance. Mas Mann quer mesmo radicalizar no seu pintar daquele filme. Usando diversos tipos de câmeras e lentes, Mann faz um cinema de ação plástico, que prima menos pelo roteiro que pelas opções estéticas que ele utilizou numa tentativa sublime de revigoração de um gênero batido, mas não morto.

Interessante, vendo todos esses filmes, perceber a multiplicidade de formas e possibilidades que se tem dentro do cinema, mais ainda dentro de um gênero como o da ação. Isso por que ainda deixei de fora cineastas fortes e relevantes como Tsui Hark, Willian Friedkin, Bong-Joon Ho e Andrew Lau. O cinema de ação prova assim que pode-se sim ser contundente e profundo, pode-se questionar a imagem, o cinema, o homem, todos eles em contato direto com a mais primitiva das leis da natureza: a violência.

Rafael C. Parrode

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A primeira noite depois da tarde



No meu último texto eu fiz um desabafo sobre o como é ruim se sentir apenas mais um homem mediano no mundo. E concluí dizendo que estava tomando providências para que as coisas mudassem. Para minha alegria, ontem a noite tive indícios que estou seguindo o caminho certo.

Na exibição pública do “Além dos Outdoors”, meu primeiro documentário, tive uma prova concreta de que as coisas estão mudando. Deixei de ser um simples espectador para estar no centro das atenções. E devo confessar que isso nunca havia me acontecido antes. Falando em termos cinematográficos, deixei de ser um mero figurante pra me tornar um dos protagonistas.

Produzir esse filme foi um dos maiores presentes desse ano. Por causa dele eu deixei um emprego cômodo, mas desinteressante, conheci gente que nunca imaginava conhecer e tive a oportunidade de aprofundar laços com outras que eu já conhecia, mas que por puro preconceito e ignorância não tinha grandes vínculos. Esse filme me abriu a mente em diversos aspectos.

Para quem está acostumado com aplaudir, receber palmas é estranho. Fica a dúvida se aquelas palmas são sinceras ou puros gestos mecânicos que a boa educação preza. O mesmo acontece com a infinidade dos sorrisos recebidos. Se pelo menos 10% forem sinceros já fico feliz.

Em nenhum momento da minha vida eu me senti tão observado. Minha auto-estima também nunca esteve tão boa. Mesmo assim, ainda não foi possível levantar a cabeça pra encarar as centenas de olhares e nem falar o discurso que já estava pronto há anos na cabeça. Pra não passar uma vergonha ainda maior, é melhor falar pouco e coisas básicas, mesmo que fúteis.

É estranho se sentir querido. É estranho ver que pessoas deslocaram um pouco a rota de seus dias para poder lhe prestigiar. No fundo eu ainda acho que não mereço isso. No fundo eu ainda acho que eu sou uma fraude e que posso provar esse fato. Admito que pensei que aquele momento acabaria assim que as luzes do cinema fossem acesas. Mas quando sua rotina é marcada por pessoas especiais, a sensação se prolonga um pouco e vai até uma mesa de pit-dog. Isso tudo são resquícios de um homem que ainda não decidiu que rumo tomar.

Paulo Henrique dos Santos.

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Onde mora um artista


Um portão foi aberto para mim. No muro, o número 1031 bem grande. Veio me receber simpaticamente. Era uma figura familiar e ao mesmo tempo cheia de coisas novas, digo, de artes novas aos meus olhos.

Naquela manhã de sábado eu podia sentir o calor... do sol que estourava no céu e de algumas pinturas em seu aconchegante atelier. Quando entrei naquele cômodo ajeitado por ele, já avistei um montante de trabalhos. Alguns, envelhecidos pelo tempo, carregados de pó. Outros, com cuidado, ele envolveu em um fino plástico com o intuito de conservá-los. Um em especial trazia as seguintes palavras: “depois de lerem esta história, vocês terão de concordar que o destino das pessoas já vem traçado antes mesmo de nascer ou, até mesmo, antes que alguém tenha sonhado com a existência de tal ser”. Eu podia até não comungar da idéia, mas tinha que admitir a profusão de texto e imagem.

Tudo estava numa desordem exata, que o localizava com rapidez em meio aos papéis, pincéis, tintas, luvas, telas vazias, todas ansiosas pelo seu toque. Caminhei um pouco mais e de repente tive um embate com um enorme quadro. A pintura era tão sinestésica que qualquer pessoa teria gosto em tocá-la. Parecia veludo, mas não tinha aparência muito suave.

Ele insistia em me ver à vontade. E eu estava. Tanto que comecei a vasculhar cd’s e dvd’s deixados em cima de um balcão. Encontrei uma discografia dos Beatles e outros achados. Ali também estavam filmes de Almodóvar, Bergman, alguns do neo-realismo italiano e, o mais incrível, X-Men – O Confronto Final! É claro que era fascinante.

Encontrei esculturas, telas retocadas de dois em dois anos. Havia três desenhos recentes que, segundo ele, envolviam toques concretistas, dadaístas e outras tendências, ambas misturadas com a sua maneira lúdica de fazer o que mais ama. Era mesmo um meninão. Se atrevia a fotografar com Nikon. Usava tripé. Não ficou pra trás na era digital. Ele sabia operar fotoshop e coreldraw!

Não havia dúvidas. Tentava fazer de tudo. Em linguagem mais apurada, alguns conhecedores o chamaram de versátil. E era de fato. Aproveitei aquele sábado de uma maneira diferente. Queria ver, sentir o gosto estético que o lugar exalava. Estranho, não é mesmo?!

Diante de mim, se apresentava um artista tímido, mas que no fundo queria ser visto através de sua arte, de seu trabalho. Na verdade, acho que não queria fama pra hoje ou pra amanhã. Ele certamente fazia tudo porque não conseguia deixar de se movimentar diante das coisas da vida. Tinha muita sensibilidade pra isso. Sua arte é do aqui – e – agora, entretanto não se contenta em ser efêmera. Prova disso é que nem por um segundo pude me desfazer daquele ambiente, das suas telas, dos seus desenhos-esculturas, 1031, 1031... Nesse número estava alguém desenhado antes mesmo de nascer! Aí não podia mesmo ser diferente, eu confesso!

Maraísa Lima.

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terça-feira, 14 de novembro de 2006

Editorial nº 4 – Novidades!!!


Publicamos nossa quarta edição com grandes novidades! Uma, é a chegada de mais uma colaboradora, com uma nova editoria que eu tenho certeza que vai agradar a todos! Literatura!!! A idéia era publicar seus poemas, mas a moça foi além! A nova editoria irá explorar obras de escritores amadores e conterá, também, ensaios, contos, análises e indicações de obras literárias! Seja bem vida à nossa Arca de misturas, Maria Clara Dunck!!!
Além disso, temos outro motivo para celebrar! Nosso blog está crescendo,devagar e sempre e conquistando, a cada dia, novos horizontes. Esta semana fomos cadastrados e passamos a fazer parte da lista de divulgação de blogs do site maisbrasilia.com. A Arca Mundo se encontra na página 24, do item Blogs!!!
Esta edição traz a crítica do filme A Criança, dos irmãos Dardenne; um texto muito útil à convivência dos sexos, sobre TPM; uma reportagem sobre o Festival Goânia Noise e o texto de estréia sobre Literatura! Uma quarta edição fresquinha para ser degustada com muita satisfação!

Publicamos nossa quarta edição com grandes novidades! Uma, é a chegada de mais uma colaboradora, com uma nova editoria que eu tenho certeza que vai agradar a todos! Literatura!!! A idéia era publicar seus poemas, mas a moça foi além! A nova editoria irá explorar obras de escritores amadores e conterá, também, ensaios, contos, análises e indicações de obras literárias! Seja bem vida à nossa Arca de misturas, Maria Clara Dunck!!!
Além disso, temos outro motivo para celebrar! Nosso blog está crescendo,devagar e sempre e conquistando, a cada dia, novos horizontes. Esta semana fomos cadastrados e passamos a fazer parte da lista de divulgação de blogs do site www.maisbrasilia.com. A Arca Mundo se encontra na página 24, do item Blogs!!!
Esta edição traz a crítica do filme A Criança, dos irmãos Dardenne; um texto muito útil à convivência dos sexos, sobre TPM; uma reportagem sobre o Festival Goânia Noise e o texto de estréia sobre Literatura! Uma quarta edição fresquinha para ser degustada com muita satisfação!
Camila Pessoa.
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Não só literatura, não só ela.

"A verdadeira filosofia nos permite descobrir isto ou aquilo; a literatura, tudo". (Gonçalo Armijos Palácios)


Teorias e mais teorias não se cansam e, provavelmente, jamais se cansarão de dissertar a respeito do que é, enfim, a literatura. Do entretenimento ao engajamento político, do teatro grego antigo à literatura do absurdo, também suas funções na sociedade são amplamente discutidas. Então, se levarmos em conta todas as suas manifestações ao longo da história – engavetadas em suas poéticas e escolas – , teremos tanto a dizer, que o propósito de explorarmos a própria literatura e, conseqüentemente, seu foco principal, que são as obras literárias, será perdido, como não raramente acontece.

Seria muita pretensão, um sinal de ignorância e causaria polêmica tachar essa editoria dedicada somente à literatura ou como dedicada à literatura. Não posso, seja por incapacidade ou por sentir impossibilidade, excluir todo o restante das editorias dessa publicação de um viés literário, já que a linha que separa as ciências humanas é tênue. Também não poderia afirmar que aqui estaria tratando apenas da mais pura literatura, desvinculada de tudo que dela necessita ou de tudo que a auxilia, seja no campo das artes, do jornalismo, da filosofia, da história etc.

Refiro-me à literatura num grau mais elevado, numa abordagem mais específica e no papel de protagonista. Ensaios, poemas, críticas, divulgações, análises etc. Serão aparatos cruciais para unir o entretenimento, a linguagem, o conhecimento e a exploração de uma arte tão apreciada.

É fato que uma citação é só uma citação ou uma poderosa arma quando retirada do seu contexto e jogada num ambiente qualquer, passível de diferentes interpretações. E uma citação é um aperitivo ou um símbolo da impossibilidade de se expor, num determinado contexto, uma obra inteira. Talvez a epígrafe citada aqui, publicada em um artigo de jornal sobre a importância da literatura, possa parecer pretensiosa e contraditória, atribuindo um crédito maior à literatura, em detrimento da filosofia. Essa citação poderia extrapolar esse entendimento, supervalorizando a literatura, diante das outras artes ou meios de comunicação, porque, aqui neste espaço, a literatura não tem limites. Tampouco terá para o leitor.
Maria Clara Dunck.
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MULHER À BEIRA DE UM ATAQUE DE NERVOS (a TPM)


Sabe aqueles dias que você acorda diferente? Primeiro aquela SAUDADE não se sabe de quê ou de quem... Aquela MELANCOLIA, vontade de colo. Em seguida você se dá conta de que NINGUÉM está disposto a te dar colo, que você é muito, muito SOZINHA. Na verdade, sente-se DESENGONÇADA, FEIA, DESINTERESSANTE e... G-O-R-D-A...

A vontade de se encolher na cama embaixo das cobertas, com janelas e cortinas fechadas toma conta e até a voz do Bial no Fantástico faz você sentir vontade de chorar. E você choraaaaa... CHORA muito. Chora por tudo, até no Jornal Nacional. Sente-se uma pessoa inútil, nunca fez nada pela fome na África, nunca será glamourosa como Gisele Bündchen, jamais terá o amor do George (Clooney). Enfim, você é a mais infeliz das mulheres, a mais miserável, a mais sofredora, a mais detestável, a mais chata. Sua auto-estima está em baixa.

De repente TODOS os seus problemas foram colocados sob uma LENTE DE AUMENTO gigantesca. E a mais insignificante das pedrinhas no caminho, torna-se um OBSTÁCULO INTRANSPONÍVEL. Ninguém a ama, seu chefe não gosta de você – aliás, por que mesmo ele fez aquele comentário sobre seu cabelo? Estão todos contra você e ficam te olhando de cima a baixo.

E quando a olham você se pergunta: ' Porque tá me olhando, palhaço?' Se irrita profundamente com qualquer comentário que lhe dirijam, e ai de quem não lhe dirigir a palavra, porque você não admite ser ignorada. Afinal, quem essas pessoas idiotas pensam que são para a tratarem assim, porra? Num crescendo surge uma vontade aterradora de ESMURRAR o flanelinha que te perguntou se podia olhar o carro e você só não esmurra porque aquela vadia do trabalho – loura, para lá de oxigenada – passa na sua frente e desvia seu pensamento para uma cadeira elétrica – lugar onde ela devia estar para aprender a não atravessar o seu caminho. E aquela vaca ainda se diz sua melhor amiga.

É nesse momento, quando está a ponto de ELETROCUTAR sua verdadeira amiga e companheira, que você se dá conta de que ELA chegou. Sim, meninas... A TPM está com vocês, a TPM está comigo, ela está com quase todas nós, invariavelmente uma vez por mês, e haja Ponstam, Atroveram, Buscopam e semente de linhaça (acreditem é bom demais). Haja amor e paciência por parte de nossos namorados, maridos, amigos, mães, pais, irmãos, colegas de trabalho, etc, etc, etc...

O melhor de tudo é saber que, se ela veio, já podemos dormir tranqüilas e voltar a ser as mulheres maravilhosas que sempre fomos. Lindas, competentes, talentosas, amorosas e seguras de si.

''Quase não me reconheço quando estou assim, quero me encolher embaixo das cobertas até tudo isso passar'' (Uma mulher de 37 anos, ontem).

''Eu choro por tudo, odeio o mundo e o mundo me odeia, quero gritar e brigar com todos à minha volta. Nem eu me suporto'' (Depoimento numa das dezenas de comunidades do Orkut dedicadas ao tema TPM).
Maria Claudia Cabral.
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O Cinema dos Irmãos Dardenne – A Criança.



Quem nunca viu um filme dos irmãos Dardenne, não imagina o quão rico e forte é o cinema que eles criaram ao longo de suas carreiras. Vencedores da Palma de Ouro em Cannes em 2000 pelo belíssimo Rosetta, eles retornaram ao Festival em 2002 com mais uma obra-prima, O Filho, desta vez, levando apenas o prêmio de ator para o excepcional Olivier Gourmet. Não bastasse, em 2005 - ano em que a seleção de Cannes primava por autores consagrados como: Cronemberg, Jarmusch, Michael Haneke, Amos Gitai, Hou Hsiao Hsien, Carlos Reygadas, Win Wenders, Gus Van Sant e Lars Von Trier - os Dardenne e seu cinema humanista e moral (mas nunca moralista), sabiamente foram mais uma vez premiados pelo júri, presidido por Emir Kusturica, por sua mais nova obra-prima A Criança, que entra agora em cartaz em Goiânia no Cine Cultura.
Os irmãos belgas fazem um cinema de câmera na mão, sempre muito próxima dos atores. Em O Filho, ela estava nas costas do personagem de Olivier Gourmet, como se ele estivesse carregando um peso, e isso fazia toda uma diferença naquela história forte que eles contavam. Aqui, ela acompanha a respiração dos personagens, se afastando ou se aproximando dos corpos de acordo com suas ações. É um estilo que às vezes lembra Bresson, neste que é, aliás, um Pickpocket bem “dardenneano”.
E A Criança não poderia ser nome mais certeiro. Certeiro, porque os irmãos nos colocam num universo basicamente pós-adolescente, em que os jovens, nessa transição para o mundo adulto, nessa sociedade cada vez mais materialista, parecem crianças, infatilizadas, frágeis.
Sonia acabou de ter um filho. Bruno, seu namorado, vive de pequenos furtos e diz que trabalho é coisa de babaca. Um dia, Bruno resolve vender o filho para a adoção. Os Dardenne começam seu filme assim: direto e reto, com Sonia e seu bebê nos braços, acabando de sair da maternidade. E a impressão que se tem é que o filme será sobre Jimmy, filho do casal de jovens. Mas os irmãos, lá pelo meio do filme, se permitem uma troca inesperada de protagonistas. Na verdade, A Criança do título é Bruno, que irá atravessar o inferno em busca de redenção. É por isso que digo que o cinema dos cineastas belgas é moral, mas nunca moralista. Bruno fará suas escolhas e, conseqüentemente, pagará por elas. Mas os Dardenne em momento algum irão julgá-lo, e sim observá-lo. E por isso, o tempo nesse filme parece ser tão importante, porque é com ele que Bruno, através de seus olhos e da consciência de seus atos, irá se tornar cada vez menos um objeto e mais um ser humano. Ao passo que seu filho, que solta apenas um choro na primeira cena do filme, irá cada vez mais parecer uma mercadoria, um pacote. Os Dardenne, nessa inversão forte de papéis, parecem ir além, injetando vida em elementos como um carrinho de bebê e uma motocicleta, nos confrontando ainda mais com essa questão do homem/objeto.
Como em Bresson, os pequenos gestos, os pequenos detalhes, podem significar bastante. E A Criança se sustenta dessa forma: construindo com muita delicadeza e profundidade, toda a lógica desse mundo capitalista, em choque com o ser humano. São muitas as cenas em que os Dardenne transbordam seu filme de possibilidades, interpretações. E o final é a conclusão perfeita para a obra impressionante que é L’Enfant. Bruno, em uma odisséia em busca de sua humanidade, ao final encontrará sua redenção. E os irmãos cineastas redentores que são, irão com isso, criar um belo manifesto humanista, tentando nos mostrar que, apesar de vivermos em um mundo em que o capital parece estar sempre à frente do índivíduo, ainda somos humanos. Triste, mas sublime!
Rafael C. Parrode
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OS MONSTROS DA CENA UNDERGROUND



Em entrevista, Léo Razuk, um dos sócios da Monstro Discos, fala da história do selo, dos festivais e sobre o que o público pode esperar da 12° edição do Goiânia Noise.


A Monstro Discos surgiu no início de 1998. Léo Bigode e Márcio Jr. tinham uma sociedade em uma loja de discos que estava perto da falência. Então, juntos, decidiram criar um selo independente, a Monstro Discos. O selo divulgaria o trabalho das bandas no festival que eles também administravam, o Goiânia Noise, que reúne bandas independentes de todo o Brasil.
Léo Bigode sabia como administrar a Monstro, sabia como produzir os discos, mas não sabia fazer shows. Paralelamente a este projeto, Fabrício Nobre, vocalista da banda MQN (Melhor Que Nada), tentava manter a sua Me and My Monkey Records de pé. Ao contrário de Léo, Fabrício não sabia produzir um bom disco, mas de shows o rapaz entendia bem. “Ele mesmo chegou à conclusão que o negócio não era fazer disco, que ele não tinha a manha de fazer disco, mas tinha a manha de fazer show.”, diz Razuk. Foi aí que Fabrício decidiu criar o Bananada (festival de bandas independentes, semelhante ao Noise). “Quando o Fabrício criou o Bananada ele foi muito influenciado pelo Goiânia Noise e pela própria Monstro. Ele era público, consumidor do Noise e então ele resolveu criar o dele, sair da cadeira e criar alguma coisa.”
Léo produzia bons discos. Fabrício produzia bons shows. Dessa união feliz nasceu o “protótipo” do que a Monstro Discos é hoje. Para completar essa promissora união, o jornalista Léo Razuk, que já estava trabalhando com a Monstros, decidiu entrar na sociedade. O primeiro trabalho dos quatro como sócios foi a produção do show do Mudhoney, uma das bandas de garagem nascidas em Seattle. O trabalho e a união dos “quatro monstros” começaram a dar resultados. “Ele (Fabrício) começou a dar um profissionalismo maior nos shows, de qualidade de equipamentos para as bandas tocarem, de buscar locais que fossem mais adequados para as bandas se apresentarem, aí eu acho que o negócio começou a andar.”
A Monstro Discos começou a ter visibilidade no Brasil inteiro devido à qualidade dos cds, das bandas e dos festivais. Foi aí que decidiram fazer parceria com outros selos independentes, entre eles a Tratore, de São Paulo, que cuida da distribuição dos discos da Monstro pelo Brasil. “Fizemos essa parceria com esses selos com o objetivo de unir nossas forças e poder contar com a ajuda logística da Tratore. A grande dificuldade dos selos independentes é a distribuição dos produtos.”
Há, também, outras dificuldades tão grandes quanto a de distribuição. A rentabilidade dos selos independentes é muito pequena. No caso da Monstro, o retorno é maior e mais rápido com os festivais, principalmente se eles tiverem apoio e patrocínio. Mas, infelizmente, isso nem sempre acontece: “Na maioria das edições dos festivais a gente depende quase totalmente da bilheteria.”
A filosofia da Monstros é a do “faça você mesmo” e com essa idéia na cabeça, vontade, dedicação e um pouco de loucura, os quatros sócios correm atrás dos objetivos e conseguem mostrar que Goiânia, apesar da fama de sertanejo-brega, é também a terra do rock’n’roll alternativo.
Esse ano o Goiânia Noise completa 12 anos! Considerado a maior festa do rock independente brasileiro, o festival acontece entre os dias 24 e 26 de novembro e vai reunir 33 bandas em três grandes noites de rock! Serão shows com bandas consagradas como Los Hermanos, Matanza, Nação Zumbi, Ratos de Porão, Mundo Livre S/A, MQN, Valentina, Pata de Elefante, Prot(o), Violins, Mechanics, e outras 22 bandas dos mais diferentes lugares e estilos.
A novidade esse ano é o espaço onde acontecerá o festival: o Centro Cultural Oscar Niemeyer. Antes realizado em locais como Centro Cultural Martim Cererê e Jóquei Clube de Goiânia, o Goiânia Noise parte para uma estrutura cada vez mais ampla e melhor. O espaço recém – inaugurado é amplo, confortável e seguro, com ótima estrutura de som e iluminação. O novo centro cultural da cidade tem agradado o público com vantagens, como por exemplo, área 100 % coberta, ar condicionado e estacionamento fechado com capacidade para 350 carros.
Segundo Fabrício, o festival é o resultado de um semestre de esforço, para trazer a Goiânia bandas clássicas da cena underground brasileira, novidades que ainda não tocaram em nenhum festival independente do país e o melhor da cena local. As grandes atrações são Los Hermanos, que fecha a primeira noite de shows, Nação Zumbi, que encerra a segunda noite e Ratos de Porão, para finalizar o último dia! Haverá, também, como já é de costume, praça de alimentação e stands de vendas de produtos ligados à cultura rock.
O preço dos ingressos está a R$ 20, 00 por dia e R$ 50, 00 o passaporte para os três dias de festival, à venda na Tribo do Açaí, Ambiente Skate Shop, Hocus Pocus ou na Monstro Discos. Quem se interessar pelo passaporte deve correr, pois só foram postos 300 passaportes à venda!
Camila Pessoa e Carollyne Almeida.
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quarta-feira, 8 de novembro de 2006

Mostra SP de Cinema - Sexto dia: Uma estória de coincidências, e um peso-pena entre dois pesos-pesados!

O Sol

Em Arca Russa, Alexander Sokuróv, utilizando-se de um suposto único plano seqüência, sem qualquer corte, percorreu toda a história russa pelos corredores do belíssimo museu Hermitage de São Petersburgo. Um elogio ao cinema, um filme soberbo que abre toda a arca da história russa até os dias atuais, num exercício ousado e profundo de imersão e poesia. E foi num desses elogios ao filme, feito à nossa editora Camila, quando ainda desenhávamos os primeiros esboços dessa pequena revista eletrônica que mal sabíamos como chamar, que ela começou a tomar forma. Havia antes, como todos sabem, a idéia de se homenagear um pasquim de pensamentos e idéias livres, que circulou na época da ditadura militar, chamado O Sol, e era sempre dele que partíamos para a busca de um nome para o nosso blog. Eis que surge o filme Arca Russa e dele, Arca Mundo – afinal, também podemos encher arcas de pensamentos, idéias livres e independentes nesse mundo cada vez mais dependente – nome que se encaixou com perfeição ao nosso pequeno projeto desse pasquim eletrônico.
Não menos que por uma coincidência do destino, vou ver o novo filme do mesmo Alexander Sokuróv e ele se chama O Sol. Engraçado como essas pequenas coisas da vida a fazem parecer mais mágica. E Sokuróv parece aqui, captar a mágica dos pequenos momentos do Sol, como era chamado o Imperador japonês Hiroito, descendente real de outro grande imperador e também chamado pelo povo de filho do sol. Hiroito foi um ditador que, na sua má acessoria militar, utilizando-se do patriotismo extremado de seu povo, entrou em desvantagem na Segunda Guerra Mundial, culminando na devastação de parte do Japão pelas bombas atômicas e seu fim como monarca real, após ser deposto pelos americanos assim que tomaram o país.
Interpretado por um maravilhoso Issey Ogata, o Imperador é registrado por Sokuróv, com sua câmera flutuante e suas fusões rápidas, como um homem que, durante a vida toda, havia sido tratado como Deus: nunca sequer abriu uma porta, pois havia sempre quem abrisse pra ele. Um homem extremamente infantilizado, dono de um terrível mau hálito e grave problema de dicção. E o filme consegue - no que havia sido uma tentativa fracassada de Sokuróv em Taurus, ao retratar os últimos dias de Lênin, em que ele acaba caindo na caricatura fácil do ditador russo – com muita sensibilidade, antes de qualquer adendo estético, injetar intensa humanidade nessa figura impressionante que foi Hiroito. Filmando seus últimos momentos até a tomada de poder pelos EUA, cada cena se sustenta no cotidiano banal do Imperador, até o seu final deslumbrante que o coloca em contato gradual com o mundo em si e na possibilidade de tocá-lo com as próprias mãos.
Sokuróv irá repetir certos cacoetes seus e um deles será sua câmera flutuante que, em certas horas, parece desproposital. Mas aqui ele parece querer investir na edição, num filme meticulosamente montado. Ainda que cansativo a certa hora, O Sol é um filme e tanto. Uma obra de um cineasta que parecia perdido em seu filme anterior, mas retoma o vigor aqui.

Cotação: * * *

Time

Não bastasse a antipatia que tenho pelo trabalho do diretor Kim Ki-Duk, ainda programei seu novo filme entre dois dos mais belos da Mostra e do cinema neste ano: Síndromes e um Século e Juventude em Marcha. Coitado. Kim Ki-Duk é um cineasta coreano que fez ao menos um bom filme, A Ilha, em que ele parecia ainda não assombrado pelo fantasma da pretensão, e em seguida, emplacou um engodo atrás de outro. Pra se ter uma idéia de sua obra de uma maneira geral, basta analisar o nome de um de seus filmes mais prolixos: Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera. Ora, se já não bastasse cada nome das quatro estações do ano, em uma espécie de metáfora pro seu filme, ele adiciona “e... Primavera”. E essa é a diese de quão pobre de sentidos e possibilidades é o cinema de Kim Ki-Duk.
Ele como sempre, escolhe filmar temas edificantes. Em “Primavera...” o tema era a existência, em Casa Vazia, a solidão e agora em Time, o tempo (e o título não poderia ser mais óbvio). Mas em seus filmes anteriores, Ki-Duk ainda investia nas suas imagens pseudo-poéticas pra dar um certo lirismo de boutique aos seus filmes. Nesse Time, o rigor com o cinema, é tão insípido quanto seus personagens volúveis e fúteis e todo aquele papo de auto-ajuda que o cinema dele tem aos montes. Por isso dizem: Ki-Duk é o Paulo Coelho do cinema... e deve ser mesmo.
Mas vamos à trama, que não poderia ser mais óbvia: Garota fica enciumada ao ver namorado flertar com outra mulher e resolve fazer cirurgia plástica para mudar seu rosto e fazer com que ele volte a se apaixonar por ela, agora outra. Ele atordoado, sem saber quem é a mulher que ama, também faz a bendita cirurgia e muda o rosto. Ela então, diante daquela insanidade completa, enlouquece. Ora, quem não enlouquece? Ki-Duk tem o talento de um aluno da oitava série que escreve as redações sobre “temas” que a professora pediu. E o pior que todo mundo acha o texto do mané lindo.
Vendo essa infinidade de filmes aqui na Mostra, ficou ainda mais difícil aturar esse cinema pseudo - tudo que o Kim Ki-Duk faz. Quem já viu Tarkovsky sabe do que estou falando.

Cotação: ●

Síndromes e um Século

Pouca gente sabe fazer um cinema tão único, tão rico e tão novo quanto Apichatpong Weerasethakul. Ele é um dos poucos cineastas contemporâneos que ainda fazem brilhar os olhos do espectador, com seus filmes tão cheios de frescor, de novidades, de surpresas. Lembro-me bem de ter visto Mal dos Trópicos - seu filme mais conhecido e premiado - uma daquelas obras-primas indefiníveis, tão autoconsciente na criação de um mundo extremamente peculiar, onde a câmera se move de outra maneira, os cortes vêm sempre nos momentos mais inesperados e a trama nunca importa. Joe - como é chamado em sua intimidade - faz um cinema de ambiências, de sentidos, em que cada imagem funciona quase que por si só, mas que, ao se unirem num todo, dão forma a uma obra surpreendente, imprevisível e nada menos que brilhante.
Com Síndromes e um Século, a impressão que se tem é que estamos diante de um OVNI, um filme diferente de tudo, um cinema estranho, mas ao mesmo tempo, tão impressionante e poderoso, que nos faz colocar Apichatpong entre os principais nomes do cinema contemporâneo.
Joe faz aqui uma espécie de autobiografia, filmando o que parece ser a vida de seus pais médicos, quando se conheceram em um Hospital no meio de uma floresta da Tailândia. Os pacientes são, em sua maioria, monges budistas que, por morarem perto, estão sempre se consultando por lá. Joe refina seu cinema a tal ponto que a impressão que se tem é a de estar diante de um mantra de imagens. Cada plano meticulosamente trabalhado pelo cineasta da a impressão de estarmos meditando, levitando no tempo e no espaço, num exercício hermético e vigoroso de cinema.
Apichatpong sempre fala das doenças do ser humano, sempre em contraponto com a natureza – ninguém filma o verde como ele – e o fascínio do homem pelos mistérios do mundo. E é exatamente isso que sentimos por Síndromes e Um Século. Um filme que da consciência monstruosa de seu autor ante o material filmado, e nas suas subversões estético/narrativas nos coloca diante de uma obra no mínimo sui generis e no máximo, genial.
Joe faz um cinema em que a imagem e os sentidos são os pilares para uma boa degustação de sua obra. Dessa forma, na junção de tudo isso, com o seu trabalho impecável de som, você pode se pegar no final da sessão em um estado de transe meditativo profundo. Afinal, a intenção de Weerasethakul é nos transportar para uma outra dimensão. Uma dimensão em que ele orquestra a magia da vida através dos pequenos momentos do cotidiano, inseridos em um mundo em que as regras são quebradas o tempo todo. Um filme seminal, assombroso e insólito. Mais uma obra-prima extremamente gratificante que tive o imenso prazer de poder ver nessa Mostra tão cheia delas.

Cotação: * * * * *

Juventude em Marcha

O digital nunca mais será o mesmo depois de Pedro Costa e sua seminal obra-prima Juventude em Marcha. Aqui, ele, num tratamento formidável da fotografia, através de planos fixos meticulosamente enquadrados, vai falar de gente, especificamente dos imigrantes cabo-verdanos que estão prestes a se mudar para o novo conjunto habitacional construído pelo governo.
Pedro Costa nos seus indefectíveis ensaios de textos sobre saudade e sobre o dia a dia e na sua relação profunda com a geometria dos espaços, eleva o seu cinema simples até não poder mais a um estado de refinamento artístico impressionante.
Muito disso vem da interpretação assombrosa de Ventura (não ator, interpretando a ele mesmo), um dos sem-tetos que estava para ser transferido para o tal conjunto habitacional. Ele é o eixo desse ensaio de poesias que tornam os homens cada vez mais homens e, por isso, mais fracos e covardes, mais saudosos e resignados, mais sábios e serenos. Juventude em Marcha é, talvez, a mais impressionante demonstração de que, pra se fazer cinema, basta sensibilidade, paixão e conexão com o que se quer filmar. E Pedro Costa agrega isso tudo num cinema bastante naturalista, impregnado de um lirismo estranho, mas profundamente belo.
Em Cannes o filme estreou na mostra competitiva e foi, sem dúvida, o choque estético do Festival. Porque Pedro Costa, bem ao modo do casal de cineastas Straub e Huilet (e seu ensaio de poesias em Gente da Sicília), filma o nada. Pouca coisa além de pequenos assuntos do dia-a-dia daquelas pessoas, que na sua banalidade, termina por nos retratar toda uma situação extremamente complexa que os imigrantes Africanos enfrentam na Europa. Além da poesia falada que irá costurar todo o filme, o cineasta português, utilizando-se dos mais imprevisíveis enquadramentos que colocam o homem perdido na geometria do espaço, na sua frieza, irá atingir o sublime, numa espécie de elogio à simplicidade. Um filme que, apesar de exigir um pouco do espectador, retribui de forma generosa, ao seu final, com um cinema cheio de frescor, pureza e sensibilidade.


Cotação: * * * * *

Rafael C. Parrode
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terça-feira, 7 de novembro de 2006

Editorial nº 03 – Liberdade é isso: Foi dada a largada para as polêmicas!


Aqui estamos nós com a terceira edição da Arca! Muitos textos interessantíssimos e muitos assuntos a se discutir: relação entre pais e filhos; entre amigos; entre nós e nós mesmos; entre nós e os filmes; entre nós e o mundo! E foi dada a largada para as polêmicas! Eu sabia que em algum momento as divergências de opiniões iriam surgir, entre nós e os leitores e entre nós mesmos. Mas não pensava que isso demoraria tão pouco tempo e nem que me envolvesse já de primeira. (risos) Nossa democracia sugere réplicas e tréplicas e lá vou eu com minha carta de resposta ao Senhor César Henrique Guazelli, pela sua citação no texto de quadrinhos.....

“ Camila, se quiser mudar o título, à vontade. Esse aí foi porque eu tava sem idéia melhor. Deve haver algum erro de concordância por aí, pois escrevi bem rápido. Não repara por ter sido usada como exemplo, viu? Beijo” Era o que dizia o e-mail.
“ Caralho! O César acabou comigo no texto dele!” Era o que eu dizia.

Como editora, eu poderia muito bem reclamar de “ter sido usada como exemplo” ou, simplesmente, editar o texto e não se fala mais nisso! Mas onde estaria a liberdade de escrever “o que nos der na telha” que eu tanto ovacionei na criação da Arca Mundo? Então, aqui estou, para os devidos esclarecimentos...
Não, eu não sou uma ignorante e não, não critiquei os quadrinhos do César, como possa parecer! Confesso que não entendo nada de quadrinhos e que passei a minha vida entrando em contato e tendo como referência a Turma da Mônica, mesmo – aliás, quadrinhos esses que eu adoro e leio até os dias de hoje! Mas, quando falei sobre a editoria de quadrinhos com o senhor César, foi em um tom de brincadeira e debochando da minha própria falta de conhecimento sobre o assunto. Concordo plenamente com todo o conteúdo do texto dele. Acho que tem muita gente desinformada e insensata por aí, que quer falar mal do que não conhece. E acho, também, que nunca é tarde para se conhcer!
Da mesma forma que eu cresci lendo Turma da Mônica, também cresci ouvindo música pop, vendo filmes Hollyoodianos e entrando em contato com literatura barata. Entretanto, em algum ponto da minha vida, pude conhecer e passar a gostar de rock e mpb, de cinema de arte e de tragédias gregas. Talvez seja agora, e com a ajuda, justamente da sua editoria de quadrinhos, que vou passar a conhecer melhor e a desfrutar (ou não) desse universo do qual ainda sou tão leiga. Dessa maneira, poderei, como você frisou bem no seu texto, conciliar Turma da Mônica e Art Spiegelman, Los Hermanos e Funk, Kiarostami e comédia romântica, Ésquilo e revistas femininas. Portanto, morte aos críticos insensatos e viva a diversiadade!!
P.S: ê César...amanhã eu te pego na esquina..... hehehehehe
Camila Pessoa.
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PARA LER OS QUADRINHOS


"Antes da minha prisão, a viagem não teria significado nada para mim’’.
Sandman

Antes de levar essa editoria adiante, gostaria de deixar algo bem claro. Pra isso, vou contar uma historinha breve. A Excelentíssima Senhora Camila Pessoa, editora e idealizadora desse tal Arca Mundo, certo dia me disse:
- César, eu estou fazendo um Blog, estou muito animada com ele e queria que você escrevesse sobre política pra mim, tudo bem?
Eu respondi:
- Ué Camila, eu posso escrever no seu Blog, é uma boa idéia mesmo, mas porque você não faz o seguinte: passa a editoria de política pra outra pessoa, porque não agüento mais falar sobre isso, e eu escrevo sobre quadrinhos?
Ao que ela respondeu:
- Ah nem César, você quer escrever sobre quadrinhos, como você vai arrumar assunto pra isso? Falar da Turma da Mônica toda semana?

Pois é. E aqui estou eu com minha editoria de quadrinhos. Só quero aproveitar a deixa da Camila pra esclarecer algumas coisas. Quadrinhos não é coisa de criança. Melhor dizendo, não é SÓ coisa de criança. Como todo e qualquer veículo de comunicação, como toda linguagem e forma de expressão, os quadrinhos (ou comics, ou banda desenhada, ou hq, como preferir) se colocam como uma possibilidade imensa de construção de realidade e criação. É difícil seguir contra uma cultura tão pasteurizada como a nossa, que não percebe a distinção entre forma e conteúdo; que tende a abstrair a construção histórica do nascimento, consolidação e exploração comercial de determinados veículos de expressão como se fosse a sua própria essência. É difícil perceber que a literatura, para a grande maioria das pessoas, não vai além de O Senhor dos Anéis, o Código da Vinci ou, mais recentemente, o Caçador de Pipas. Igualmente, é duro abstrair que o cinema é tão visceralmente atrelado, no imaginário coletivo, aos mecanismos de Hollywood, engessado em um padrão de codificação lingüística caduco e pouco atrativo, e que a maioria desconhece a quantidade de produções feitas no mundo todo fora do eixo do cinema industrial. Coisa ainda pior ocorre na música. Sempre me deparo com tribos e grupos que ouvem determinado estilo de música e, de forma quase irracional, excluem outros vorazmente, apenas para se afirmarem. Assim, bangers, indies e grungeiros não podem ouvir música baiana, brega, forró, pagode ou sertanejo, sob a pena de serem tachados de posers. Vivemos em um mundo que limita.
A forma dos quadrinhos é uma coisa, o conteúdo é outra. Se os comics se afirmaram, enquanto cultura de massa, sobre a exploração de personagens animais antropomorfizadas (Gato Félix e Pato Donald são ótimos exemplos) e super-heróis, isso não quer dizer que devam ser, necessariamente, escritos nesses moldes. Muito pelo contrário. Há uma vastidão enorme de produção quadrinizada profissional e amadora em todo o mundo - embora eu ache essa distinção absurda – nas mais diversas linguagens, sobre uma variação temática quase ilimitada e, a cada dia, mais autoconsciente e inteirada de seu papel, seu ‘’fazer-se’’ e seu lugar, que se amplia a passos largos. Aos poucos, os quadrinhos são aceitos no meio acadêmico (Humberto Eco tem grande contribuição nisso) e afirmados como produção séria, especialmente após Art Spiegelman ganhar o prêmio Pulitzer com seu MAUS e Joe Sacco se tornar uma elogiada referência com seu jornalismo em quadrinhos, produzindo obras monumentais como Palestina – Uma Nação Ocupada e Área de Segurança Gorazde. O que esses dois autores conseguiram em termos de profundidade e sensibilidade na representação dos horrores do Holocausto, da Guerra da Palestina e da Guerra da Bósnia é algo impressionante e digno de menção, que vale a pena ser lido.
Entendamos por quadrinhos toda e qualquer forma de representação baseada na exposição seqüencial de desenhos ligados por uma lógica discursiva. Os quadros componentes da história podem ser puramente pictóricos ou apresentar também elementos textuais que representam falas, pensamentos e narrativa em off. Dentro desses padrões, o único limite é a capacidade criativa do autor.
Se eu gosto de super heróis? Claro, alguns. O que eu tenho contra a Turma da Mônica? Nada. Sou um grande fã. Qual minha implicância com O Senhor dos Anéis e O Código da Vinci? Absolutamente nenhuma. São leituras muito agradáveis. Se eu tenho cisma com Hollywood? De jeito nenhum. Adoro me deleitar com os efeitos especiais de última geração e aquelas explosões fabulosas dos filmes de ação. Se eu sou poser? Huumm.. nos termos apresentados, sou sim, absolutamente. A questão não é a crítica pela crítica. Somente acho que não podemos ver o mundo, limitados pelo cabresto. Se não gosta de quadrinhos, tudo bem. Mas tem uma coisinha: se quiser criticar, argumente. Se quiser argumentar, conheça. Se quiser conhecer, leia. Em outros termos: DEIXEM DE SER PRECONCEITUOSOS! IÉ!
César Henrique Guazelli.
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