quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

Editorial nº 07: Sobre o dia-a-dia

E voltamos finalmente às misturas nossas de cada dia!!!! Começamos a celebrar o Natal... que coisa linda!!! E brega, alienada, comercial........ muito bem humorada a crítica do Paulo Henrique dessa semana referente às festas de fim de ano!!! Humm além disso.... alguém já parou pra pensar em como seria mais feliz e em como a vida seria mais fácil se pudéssemos amar nossos melhores amigos? Esse é o tema escolhido nessa edição por Maria Claudia Cabral! Nosso amigos são perfeitos para nós, mas.... são nossos amigos, quase irmãos!!! Todo mundo fala isso, né? Talvez devêssemos tentar reconsiderar, ao invés de ficar por aí quebrando a cabeça com pessoas tão diferentes de nós mesmos! (Fácil é falar! Além de nós, quem mais continua se aventurando?) Além disso, Rafael C. Parrode faz um rápido giro pelos últimos filmes do mestre cineasta Almodóvar, Maria Clara Dunck nos delicia com mais um de seus poemas e Eula Lôbo tenta abrir-nos os olhos pra uma realidade na qual quase nunca reparamos! Aos nossos leitores: continuamos ansiando por seus comentários para que possamos concretizar nossa comunicação de duas direções! Um abraço e boa leitura!!!


Camila Pessoa.
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As Cores de Almodóvar


Lembro-me da primeira vez que vi Carne Trêmula, filme esteticamente menos efusivo do cineasta Pedro Almodóvar, mas talvez o mais carregado de violência e sexo, de relacionamentos conturbados, de carne, de traição... Aqui Almodóvar não carrega nas cores como fazia nos filmes de sua primeira fase, quando filmava o universo feminino daquela maneira deliciosamente abusada e arregalada, no limite entre o kitsch e o bom-gosto. Carne Trêmula é então o início de uma fase mais madura e mais consciente de Pedro Almodóvar diante de seus fantasmas do passado, seus dramas de infância e sua visão particular do mundo.

Eis então, que ele surge com o extraordinário Tudo Sobre Minha Mãe, filme em que ele destila sua paixão à cinefilia, homenageando o clássico All About Eve (A Malvada de Joseph Mackienwiks) ao mesmo tempo que abusa do melodrama, mantendo um impressionante domínio da imagem, nesse que é talvez o seu melhor roteiro e possivelmente o mais sensível de seus filmes. Filme ainda com forte toque feminino, Tudo Sobre Minha Mãe é, entretanto, uma mudança forte na carreira de Almodóvar, em que ele parece mais sóbrio, lidando com temas mais caros, mais fortes, abusando do melodrama e da metalinguagem pra homenagear o cinema e sua mãe, numa de suas obras-primas mais bonitas, que fazem brotar lágrimas dos olhos sem muito esforço.

Mas é com Fale com Ela - na minha opinião, seu melhor filme - que Almodóvar irá chegar ao ápice de seu talento como fazedor de imagens que é. Ele parece estar num equilíbrio impressionante entre estética e conteúdo, nesse que é o seu primeiro filme efetivamente masculino, ainda que diga muito sobre as mulheres. Almodóvar nessa história monstruosamente humana e delicada, irá criar um filme denso, triste e riquíssimo, nos brindando ainda com seqüências inesquecíveis como a da tourada ao som de Elis Regina e da magistral cena do cinema erótico mudo, em que um dos personagens adentra uma imensa genitália feminina.

Má Educação é o encerramento de um ciclo de um Almodóvar mais sombrio, forte, emocionalmente mais violento e contundente. Nesse que é o seu filme mais pessoal, ele irá numa abusada homenagem aos filmes Noir, criar sua obra mais obscura e visceral. Um filme que escancara os fantasmas de seu passado, numa crítica contundente à igreja, mas antes de qualquer outra coisa, uma homenagem ao cinema, porque, com seus planos meticulosamente filmados, no seu uso impressionante de vários tipos diferentes de janelas ao longo do filme e na montagem absurdamente impecável ele irá criar o seu filme mais seu, mas inquestionavelmente o mais singular de toda a sua carreira.

Chegamos então a Volver, novo filme do mestre espanhol em que ele parece encerrar sua brilhante fase dark, pra nos confrontar com a leveza do universo feminino (ainda que leveza para Almodóvar seja algo como incesto ou coisas do tipo), repleto de cores que só mesmo ele consegue pintar com tanta beleza, num retorno a seus temas do início da carreira, às suas antigas musas – Carmen Maura e Penélope Cruz excelentes – e a sua maneira bem particular de tratar de dramas humanos. Volver é indiscutivelmente um belo filme, mas não chega a ter a potência dos filmes da recém terminada segunda fase de Pedro.

Se Volver não é a obra-prima que passamos a esperar de Almodóvar depois de uma sequência impressionante de filmes geniais, é na pior das hipóteses, um dos melhores filmes do ano, o que quer dizer que Almodóvar não precisa se superar filme a filme pra fazer cinema de alto nível. Até seus filmes menores são maravilhosos. O que faz de Volver uma pequenina e formidável pérola pintada lindamente com as cores de Almodóvar.
Rafael C. Parrode.
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