domingo, 14 de outubro de 2007

“Síndrome do Fantástico”... Desacostumado...

Em 2002, exatamente no dia 14 de fevereiro (aniversário de nascimento da companheira de Lênin, a educadora Nadezhda Konstantinovna Krupskaia), eu estava em minha defesa de dissertação, cujo título era “O Lúdico-revolucionário no MST: a prática pedagógica do Encontro dos Sem Terrinha”. Como todos os que vivem e/ou viveram esse parto de fechar uma monografia, uma dissertação ou uma tese, por mais organizado que estejam, é sempre nos meses que antecedem a defesa que as noites viram dias, os dias continuam dias e as horas passam rápidas e lentas, não necessariamente nesta ordem.

Durante os dois meses que antecederam minha defesa, estabeleci duas estratégias no quarto do apartamento em que morava (e que servia de escritório): a primeira, tinha a ver com meu rendimento intelectual que sempre foi à noite e, por isso, coloquei mantas densas nas janelas para que a sensação noturna fosse, a cada dia, se estabelecendo. A segundo foi deixar o violão bem ao lado, no pedestal.

Enquanto organizava a dissertação, seus capítulos, descrição metodológica, idas e vindas entre os capítulos, aquele parágrafo que demorou um dia para sair, novas consultas bibliográficas, retomar anotações de diário de campo, e-mail’s e mais e-mail’s com a orientadora etc., vez por outra botava tranqüilamente o violão no colo e começava a dedilhar pequenas melodias, novas ou já conhecidas por mim.

Eis que, numa manhã de uma longa e produtiva noite de trabalho, resolvo dar fruição aos pequenos dedilhados que deslizavam por aquelas seis cordas, já havia alguns dias. Saiu uma leve melodia, bem para violão mesmo, um pouco até fora de meu estilo que sempre busca batidas melódicas mais progressivas.

Toquei-a em público uma vez... há algum tempo não a toco e hoje fiquei buscando as notas. Encontrei-as parcialmente, mas lembrei com alegria o momento em que a compus.

Apresento “Desacostumado”:

Ando tão acostumado com a vida./ Desacostumado de não caminhar em frente, sem olhar p’ra trás./ Sem parar p’ra beber um copo d’água, cristalina./ Ando tão acostumado com a melodia que agora vou tocar/ que talvez nem fosse preciso cantar,/ só um zin-ze-za-du-iê-na-iê p’ra você,/ sempre acostumada a ouvir minhas canções ao pé de ouvido, debaixo da sacada do seu coração./ Em que pese minha nota desafiada.

Ando tão mal acostumado/ a ter idéias difusas, saudavelmente viajadas./ Um mundo sem perdedores, amores sem desamores/ e o anti-herói com anti-poderes/ que só consegue ver na Lua sua super-visão./ Imagens sem ilusão, / infinito e concreto pensamento/ abstrato quando meus dedos tocam você./ Minha viagem desafiada.

Não vale a pena eu me perder neste caminho./ Eu descaminho./ Não vale a pena eu perder este caminho.

Ando tão mal desacostumado/ a bem querer o que é longinquamente perto de minhas mãos./ Um abraço mais profundo,/ um sorriso intransponível, apaixonado./ Se penso em você, esqueço o seu nome/ e passo a imaginar nossos odores em contato./ Um beijo pelo tato,/ não existe nada mais desafiado.

Não vale a pena eu me perder neste caminho./ Eu descaminho./ Não vale a pena eu perder este caminho

Marcelo "Russo" Ferreira

PS.: Essa canção tem registro da letra e tem melodia própria. Mas, se alguém se arriscar de “reescrever” sua melodia, lembre-se da história destas letras amontoadas, melodicamente amontoadas... são de minha história.