segunda-feira, 31 de março de 2008

Começo, Meio e Fim

A vida tem sons
Que pra gente ouvir
Precisa entender
Que um amor de verdade
É feito canção,
Qualquer coisa assim,
Que tem seu começo,
Seu meio e seu fim...


(Tavito - Ney Azambuja - Paulo Sérgio Valle)


...Essa relação chegou ao fim. Não foi meu amor pela escrita e pelos escritos, também não foi meu amor pelos companheiros do caminho maravilhoso que se iniciou em 2006, na cidade de Goiânia, mas sim esse pedaço da minha estória - ArcaMundo chegou a termo para mim.


Assim como partiu Camila, para a construção de uma nova etapa de vida na Alemanha, agora parto eu, que mesmo já não morando mais em Goiânia seguia contribuindo para a Arca - como carinhosamente a chamávamos.


Arcamundo foi a experiência mais importante dos últimos tempos. Graças a Parrode e Camila tive finalmente coragem de me expor e expor meus escritos. Aqui discorri sobre temas diversos, notadamente aqueles ligados aos sentimentos e à forma de ver e sentir o mundo.

Esse lócus compartilhei anseios, dúvidas, medos e afetos. Aqui tornei público, gritei para o mundo muitas das minhas dores, forjando uma naturalidade, muitas vezes mais desejada que sentida.

Aqui disse, em linhas gerais, como vejo - ou via - o mundo. E de tanto mostrar a todos meu mundo, precisei olhá-lo com mais vagar e atenção.

Assim foi que me recolhi numa casinha no campo, alugada e decorada especialmente para me propiciar mais e mais momentos de contato com meus sentimentos, minha história e meus escritos.

Embora esteja imersa em meu próprio mundo há meses, não tenho compartilhado nem aqui, nem em qualquer outro espaço esse processo. Desculpem, esse foi um tempo e um espaço só meus.

Eis-me aqui. Cabeça erguida, pronta para mais um caminhar, pronta para uma nova estrada. Não há como seguir por Arcamundo sem ficar com um gosto de comidinha requentada. Preciso novos ares, sobretudo de um novo espaço. Agora, preciso de um espaço que eu possa chamar de meu.

Nada contra os ideais socialistas, nenhuma apologia ao individualismo da sociedade consumista. Apenas um sinal inequívoco de que há tempo para o coletivo, e tempo para o individual. Este é, para mim, momento de individualizar o espaço e assim poder melhor compartilhar sentimentos, valores e pensamentos.

E nesse tempo, em que tenho trabalhado cada dia mais fortemente pelo coletivo, pelo social, nada melhor que ter um pequeno sítio, local de cultuvo da subsistência para plantar meus amigos, meus livros, meus discos, meus filmes e nada mais.

Foi bom estar com vocês e receber contribuições, sugestões e críticas. Foi bom debater e aprender semanalmente um pouco de cada um. Parto de Arcamundo diretamente para o Blog da Maria (http://blogdamariaclaudia.blogspot.com). Aguardo vocês por lá!



Maria Cláudia Cabral

domingo, 23 de março de 2008

“Síndrome do Fantástico”... O sanfoneiro...

“Quando olhei a terra ardendo
quá fogueira de São João...”
Luiz Gonzaga

Dia destes, estava eu andando entre dois centros comerciais de Brasília. O CONIC (que é uma espécie de shopping com escritórios, onde concentram-se centrais sindicais e partidárias – do campo de esquerda, em sua maioria) e o Conjunto Nacional (que tem mais cara de shopping, com lojas, cinema, praça de alimentação e, também, uma série de escritórios de serviços – médicos, odontológicos, cabeleireiros entre outros), separados pelo viaduto que passa “por cima” do Eixo Monumental de Brasília (que leva à e da Explanada dos Ministérios e Praça dos Três Poderes).
Na verdade, estava pesquisando preços de violão, haja vista o meu não ter agüentado o clima seco de Brasília e não ter mais salvação...
Passei em algumas lojas no CONIC, levantei preços, testei um aqui, outro ali e, depois de ter anotado os preços e seus estabelecimentos, resolvi almoçar no Conjunto Nacional. Seguindo pela calçada, à minha esquerda, lá estava aquele senhor, tocando sua sanfona (ou acordeom – realmente, sei que existe, mas não sei a diferença), acompanhado de sua esposa... pelo menos parecia se tratar de sua esposa.
Era uma quarta-feira, e um sol de 11:30 da manhã, escaldante, vertical, imperdoável. Quem caminhava naquele calçadão, sentia a sua força e imponência. Lá estava aquele senhor, tocando sua sanfona, com sua esposa segurando uma grande sombrinha sobre eles e, à frente, um pequeno banquinho de madeira com uma velha e desgastada vasilha de plástico azul e algumas poucas moedas, quase vazia.
Ao ver aquela cena, de longe, diminui o passo. Inicialmente, o fiz para escutar melhor o som que saia daquela sanfona. A seguir, a manutenção do passo lento foi para observar às pessoas que passavam e, lamentavelmente, não escutavam o som daquela sanfona... afinado... leve... firme... claro... limpo. Escutava um “xóte” que, uma pena, não reconheci. Mas sei que era um xote...
Segui meus passos e fui almoçar... Enquanto fazia meu prato e pagava, ficava construindo a minha pequeno-burguesa decisão: “Na volta, vou deixar um trocado”. Isso, enquanto almoçava uma refeição que me custou (Ave! Brasília!) cerca de R$ 20,00.
O que mais fiquei imaginando daquela cena foi a eminente possibilidade de aquele casal ter se conhecido por conta daquela sanfona. Fiquei imaginando aquele casal, surrado pela idade, se conhecendo há anos atrás, em um pequeno salão de festa comunitária, regada a um forró bem tocado pelo mais singelo e perfeito trio que o representa: zabumba, triângulo e a histórica e sempre necessária sanfona. Fiquei imaginando aquele senhor, jovem, imponente, sorridente, levando, com maestria, sua sanfona, com o perfeito acompanhamento de seus parceiros inseparáveis. Fiquei imaginando se aquela sanfona não foi imprescindível na tímida e verdadeira aproximação daquele senhor e daquela senhora que, naquele dia, entre o Conjunto Nacional e o CONIC, às 11:30 da manhã, procuravam juntar alguns trocados para, talvez, garantir a refeição do dia... E eu almoçando o equivalente à R$ 20,00...
Ao terminar minha refeição, separei uma nota de R$ 50,00. Segui de volta ao CONIC, pois já havia feito a comparação dos preços do violão (sim, voltei, em princípio, por isso) e, ao passar pelo casal – que ainda estava lá, no mesmo local – me aproximei daquela senhora, colocando a nota diretamente nas suas mãos.
“Deus o abençoe, meu filho”.
Segui, fechei o negócio e voltei ao Conjunto Nacional, para buscar meu carro e seguir caminho. Lá estava o casal... e o sanfoneiro ainda tocava.
Todos nós, com absoluta certeza, encontramos sanfoneiros em nossos caminhos... Não sei se me orgulho dos R$ 50,00 que deixei nas mãos daquela senhora... Não sei se me orgulho de relatar essa história no Arcamundo... Não sei... Realmente, hoje, no arcamundo, eu não sei...
Mas o som da bela sanfona, o sorriso daquela senhora, o meu almoço, o violão que comprei, o conjunto e o resultado desta obra toda, ainda assim, não era mais belo que o som afinado, leve, firme, claro e limpo daquela sanfona.
E, do outro lado da rua, o som alto invadia o ambiente: “Creu!”

Vida Longa...

Obs.: A história é real, aconteceu... Mas, se fores usar algumas das palavras aqui apresentadas, não deixei de lembrar destas minhas reflexões e de minha autoria.

domingo, 16 de março de 2008

Síndrome do Fantástico... Férias...



“Síndrome do Fantástico”... férias...



“Eu tava andando na rua.
Chovia e tava calor...”
(Taxímetro – Oswaldo Montenegro)


Pois é, estava de férias...
Bom, mais ou menos de férias...
Li Saramago, assisti um monte de filmes – O Clã das Adagas Voadoras e a História de Gengs-kan – e a shows – Yes, Antônio Carlos Nóbrega e B.B.King (dvd) – fantásticos, atualizei (de novo) minhas leituras de Caros Amigos e Carta Capital, revistas que sempre recomendo. Ouvi músicas lindas, músicas que me levaram a viagens sem sair do lugar.
Por outro lado, mesmo de férias, trouxe umas tarefinhas de trabalho p’ra casa. Documentos de Conselhos Nacionais, a organização de uma ação de “Formação de Formadores” (sempre gostei desta expressão: formar formadores...). E paguei contas, muitas contas.
Nas minhas férias, comprei um violão novo, com amplificador e resgatei não só minha memória de notas, minha memória das músicas que tocava, mas também minha memória das cordas, dos acordes, do juntar acordes... mas a música nova ainda não veio... ainda...
Nas minhas férias, comecei a estudar contra-baixo. Tenho um baixo acústico, preto, Gibson... Meu professor, na minha primeira aula, me ensinou “Good Times, Bad Times” do Led Zepellin, me ensinou as tríades, a tocar só com a mão esquerda (não que eu tenha aprendido ainda) e o Slepp.
Nas minhas férias, cuidei de Hércules (o macho) e Kaia (a fêmea), meus dois mestiços de pastor com são bernardo, e também da pequena Janis Joplin, que dizem que é xarpei com pastor... Ficamos longas hora na varanda de casa, vendo o tempo passar (nós quatro). Ah! Tem o maninho, um pequeno gato que adora o Hércules (e vice-versa), mas ele é mais enjoado.
Nas minhas férias, procurei cuidar da saúde, procurei cuidar do coração, procurei cuidar das palavras. Minha unha do pé encravou, meu joelho continua “rangendo” e, claro, gripei... bem na última semana. Mas dormi e continuei a acordar cedo, para ver o dia começar.
Nas minhas férias, oportunizei o silêncio e a solidão... Para refletir, tratam-se de santas companhias.
Nas minhas férias, assisti a jornais, muitos jornais... Fidel não é mais presidente de Cuba, mas Cuba continua resistindo a décadas de bloqueio econômico. Uma ilha “deste tamainho”, enfrentando não apenas a arrogância autoritária de um país quase continental, mas, principalmente, a covardia de tantos outros países que acatam este bloqueio.
Nas minhas férias, vi e revi as cenas de agressões dos fortes aos fracos. Mulheres que deveriam cuidar de um idoso, mas o agridem. Pessoas que iam assistir jogos de futebol, e se matam. Países “em nome da democracia” continuam a oprimir povos e mais povos (milenares) do oriente médio e do hemisfério sul. A soberania de outros povos é suprimida e o Imperialismo continua a defender o indefensável.
Nas minhas férias, os fantásticos e espetaculares programas dominicais continuaram a usar a tragédia alheia como seu filão de audiência. E como se explora a tragédia alheia neste mundo afora. Vi e ouvi tantos “sem saber que estávamos gravando...” que me perguntava, sempre: “e podem?”.
Nas minhas férias, mesmo nelas, continuei a assistir como o poder (ah! O poder) se manifesta constantemente à nossa volta. O poder da mídia, o poder da formação de opinião, o poder da hierarquia... vi o poder de escrever o que se acha que deve escrever, sem pensar nas conseqüências. Vi o poder se manifestar na ofensa e na ironia das palavras, (des)tratando as pessoas como se fossem “comida de enfeite” (ou enfeite de prato principal). Vi o poder se manifestar na velha regra política “quanto pior, melhor” (que chega em lugares bem menores do que a amplitude que a mídia nos faz crer que existe somente na política de peixe grande). Vi o poder se manifestar na mentira descarada, no desrespeito desnudado, no silenciar por trás da mesa.
Nas minhas férias, passeava pelo arcamundo, e como é estranho vê-lo em silêncio.
Férias, uma maneira a qual o capital e nós, trabalhadores, estabelecemos uma relação que, de fachada, parece harmoniosa.
Não descansei nas férias, mudei o ritmo.

“Se o mestre vento tenta ser como o vento, então, tem que estar em qualquer lugar”
Vida Longa ao Arcamundo!

P.S.: falei de minhas férias, de algumas coisas que, no plano geral, fiz, refiz, pensei, não pensei... nada de autoral.