Pedimos desculpas pelo atraso da sexta edição! E sem mais demoras: leiam-nos!
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Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.
Com força e com vontade
A felicidade há de se espalhar
Há de mudar os homens
Antes que a chama apague
Antes que a fé se acabe
Antes que seja tarde.
(Ivan Lins e Vitor Martins)
Esta semana fui surpreendida por uma indagação curiosa. Um amigo especial queria saber com que livros fiz minha receita de felicidade. Isto porque quando nos conhecemos, afirmei que me considero uma pessoa feliz. Haverá receita de felicidade?
Refleti um tiquinho sobre o meu sentido de felicidade. Acho que qualquer coisa que eu diga vai soar muito clichê. O fato é que, sendo ''clichê'' ou sendo acadêmica, a noção de felicidade passa pela noção de amor, portanto, farei uma viagem indo do teórico ao empírico, e quem quiser que conte outra.
Falar de felicidade é lembrar de Ortega y Gasset, filósofo espanhol do século XX. Acho fantástico como ele coloca o amor no centro das coisas, como mola propulsora. Acho interessante o seu ''eu sou eu e minhas circunstâncias'', que eu diria ''eu e minhas possibilidades''.
Falando em possibilidades, não poderia deixar de citar o ótimo documentário, que assisti recentemente: ''Quem somos nós?'' Afinal, é ciência - portanto ainda estamos na academia - física quântica, a física das possibilidades e a nossa capacidade de criar realidade. O meu sentido de felicidade passa pela idéia de escolha, de optar por criar a felicidade dentro e em torno de mim.
Mesmo não sendo afeta a livros de auto-ajuda ou fórmulas prontas, citaria algumas frases, que embora bastante clichês – não há como fugir - são verdadeiros ''mantras sagrados'' no caminho da felicidade que criei para mim. Ei-las:
1. A dor sempre vai existir, o sofrimento é opcional; Eu escolhi aceitar a dor, quando inevitável, mas escolhi também não sofrer. Como diria Roberto Shinyashiki, ''Ter problemas é normal, ser derrotado por eles é opcional''.
2. A felicidade depende exclusivamente de mim, de mais ninguém.
Essa é uma de minhas prediletas, porque realmente acredito que nossa felicidade afetiva não está nas mãos de outra pessoa, seja amigo, namorado, marido, seja quem for. A responsabilidade por nossa felicidade está em nossas mãos. Não é justo transferí-la para os ombros de outro.
3. Sou responsável por minha vida, por minhas escolhas, por meus sentimentos e por meu comportamento diante da vida. Só posso mudar a mim mesmo. Mudar a mim mesmo é escolher mudar minha atitude diante da vida, e isso já é um passo bem grande (e difícil).
Aqui vale uma observação: Sou dona das minhas ações, das minhas escolhas, mas não sou Deus. Isto significa que não tenho o controle de tudo a minha volta, ao contrário, tenho governabilidade sobre nada, salvo minha forma de reagir aos fatos. Isto é muito importante, ajuda a evitar a ansiedade. Tendo feito minha parte, aguardo os acontecimentos.
4. Ninguém dá aquilo que não tem. Amar-se é fundamental, só então posso realmente amar outra pessoa.
5. Sou minha melhor companhia. Se eu não me acho uma boa companhia, como posso esperar que os outros gostem de estar comigo?
6. Faço coisas inéditas, extraordinárias, ao menos uma vez por ano.
Resolvi fazer coisas extraordinárias no Reveillon de 2003. Decidi que no Reveillon de 2004, em lugar de estar na frente da TV assistindo a queima de fogos no Rio, eu correria a São Silvestre. Preparei-me durante todo o ano de 2004, e no dia 31 de dezembro, lá estava eu – uma ex-sedentária – correndo os 15km do percurso da 80ª São Silvestre. Cruzei a linha de chegada, depois de 1h53min da largada, exausta, na presença de milhares de pessoas que aplaudiam os grandes vencedores daquela prova. E entre eles, estava eu, que venci minhas próprias limitações. Acreditei, investi e realizei algo extraordinário. Dali em diante tenho feito isso sempre, ao menos uma vez por ano realizo algo inédito em minha vida.
5. Auxiliar os outros é uma grande forma de ser feliz. Vale a pena experimentar.
O que mais posso dizer? Não sei, sinceramente sou Maria Cláudia, não sou Dalai Lama. Não sou perfeita, estou longe disso. Ainda tenho um longo caminho a percorrer. Estou percorrendo o caminho, ''porque o caminho só existe quando a gente passa''.
''Acho que a 1ª vez que nos falamos, você disse que era feliz.''(Um amigo, 20 de novembro de 2006).
"Felicidade não é uma meta, mas um estado de espírito". "Ela é feita de pequenas coisas". (Roberto Shinyashiki)
Maria Claudia Cabral
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Por isso, ou por nada, vi a necessidade de transformar em poesia o andar nosso de cada dia e todas as suas farpas adquiridas ao longo do caminho; ou pelo menos uma tentativa, pois para o bom brasileiro, ou não, talvez o melhor slogan seja caminhar é preciso, pelos olhos de outros poetas: os de nós mesmos.
Caminhada
Hoje eu aprendi o significado do “caminhar para espairecer”
Que sempre me disseram entre rugas,
Mas nunca pude compreender.
Porque minhas pernas inquietas, chatas e estranhas
Não conseguem mais suportar toda a angústia
De quem pouco tem a ansiar ou desistir.
Pois eu sei, mais do que meus próprios ossos,
Que andar é negociar com os sentimentos,
E eu ando.
Então descobri, que além de escrever
Pra estragar e consertar,
Posso caminhar e respirar o orvalho.
Então direi aos interessados
Que as lágrimas vieram da madrugada,
Das pessoas que entoavam preces nas esquinas,
E das que paravam em fila dupla pra fumar um cigarro.
E eu que não sabia que às vezes é preciso parar...
Eu cantei e esqueci que o dia veio
Pra que eu pudesse ver claramente a realidade.
Deitei e esperei a noite chegar
Pra sonhar aquilo que eu não consegui ver.
Insista, me disseram, nesse eterno espairecer.
Ontem eu insisti, e por volta das 20 horas eu morri.
Volto inadequada, insana e veloz pra lhe dizer
Que não dura, aqui, a hipocrisia,
Pois ela é cansativamente esmiuçada em segredo.
Ordem, calma e regresso.
No outro dia é preciso acompanhar a volta,
Mesmo que tardiamente:
Já que nem mesmo no caos eu me acho
Devido à minha incapacidade de lidar com o incoerente.
Pensar os quadrinhos no Brasil, bem como a questão racial no país, é uma tarefa complexa e delicada, sempre margeada pela problemática da exclusão e consubstanciada pela indiferença. No âmbito da discussão racial a problemática toma contornos maiores, tocando questões como direitos humanos, transformação e redimensionamento histórico das formas de preconceito, a apropriação simbólica de um grupo, o negro, pelo outro, o branco – esse outro portador dos meios e canais de difusão comunicacional – capaz de construir hegemonicamente não somente o discurso sobre si mesmo e demais grupos, mas apropriar-se da realidade social e histórica, redimensionando-a para criar simbolicamente um universo moldado pelo seu olhar.
Em relação aos quadrinhos, a questão da marginalidade, menor em dimensões pragmáticas, mas também importante nos limites desse editorial, configura-se igualmente no universo da apropriação discursiva: as mídias surgidas em fins do século XIX e difundidas durante o século XX são vistas pela maioria como instrumentos de massificação, moldadas dentro da lógica da utilidade econômica, diluídas em termos de profundidade teórica e submetidas ao compromisso com a lógica do prazer demandada pelo capital, em detrimento do compromisso com o conhecimento. Essa visão academicista e textualista sofreu transformações à partir da década de 70, com o advento da semiótica. Á partir daí, a imagem alcançou novo patamar na compreensão dos processos da produção de sentido, antes limitada à análise do texto.
O binômio quadrinhos e representação do negro pode ser bem percebido no Brasil em Ziraldo e Maurício de Souza. Maiores produtores de quadrinhos no país desde a década de 70, conseguiram superar as sérias restrições a quem tenta sobreviver de HQ's por aqui, criando universos significacionais de relações extremamente complexas. No primeiro, destacam-se as histórias da Turma do Pererê, publicadas à partir de 1960. Do segundo, a Turma da Mônica, de 1970.
A Turma do Pererê é um universo mitológico criado por Ziraldo, claramente ancorado no nacionalismo modernista. Herdeiro da tradição lobatiana, também influenciado por outros nomes do modernismo – a exemplo de Mário de Andrade – o autor foi capaz de discutir a realidade nacional de forma extremamente crítica através de um universo lúdico infantil, protagonizado por Saci-Pererê, mito do folclore brasileiro redimensionado pelo autor e inserido em um universo cujo epicentro espacial é a Mata do Fundão. Aí, Pererê convive com um grupo composto por duas negras (além do próprio Pererê), Boneca-de-Piche e Mãe Docelina e dois Índios, Tuiuiú e Tininim, além de um grande grupo de animais típicos da fauna brasileira humanizados e batizados com nomes como Moacir (jabuti), Galileu (onça) e Alan (macaco). Os dois brancos presentes no núcleo principal de personagens, o caçador de onças Compadre Tonico e seu companheiro Sêo Neném, são dimensionados com características típicas de vilania, apresentando-se como antagonistas no universo em questão.
A Turma da Mônica de Maurício de Souza, universo quadrinizado mais popular do país, apresenta características bastante distintas da realidade forjada por Ziraldo. As quatro personagens principais, Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão, são construídas através de estereótipos e características muito bem definidas, de onde é extraído o humor nas tiras. A primeira, dentuça e com enorme força física, sempre carrega um coelho de pelúcia azul. È freqüentemente almejada por planos infalíveis que sempre falham de Cascão e Cebolinha, o primeiro com aversão a água, o segundo, troca a letra R pela letra L ao falar. Magali, companheira de Mônica, tem um apetite voraz e insaciável, sem, com isso, engordar. A habilidade com que Maurício constrói estórias baseadas nos estereótipos supracitados é notável.
Além das personagens centrais, destaca-se ainda um enorme núcleo de personagens secundárias, acionadas em momentos muito específicos, normalmente quando é necessário para a história formar grandes grupos. Servem, portanto, como um universo de reserva. Nesse núcleo secundário, encontram-se diversas personagens que se encaixam no que podemos chamar de minorias: O mudo Humberto, o japonês Nimbus, os negros Jeremias e Pelezinho (esse já não publicado), a deficiente visual Dorinha e o cadeirante Luca, estas, personagens recentes.
O que se vê portanto, é uma configuração base seguida por Ziraldo e Maurício de Souza, centrada na utilização de um núcleo central de protagonistas que atua como agente causal. Entretanto, Ziraldo, ao fazer a Turma do Pererê, tomou o cuidado de adequar suas personagens à realidade étnica do país, enquanto Maurício de Souza fez justamente o contrário. As minorias de Maurício de Souza são mera propaganda social, enquanto a turma do Pererê assume contornos muito maiores. Jeremias só é utilizado quando são necessárias personagens secundárias que dêem continuidade à cadeia de acontecimentos da trama. A função dele na Turma da Mônica, nesse sentido, é muito precisa: ser negro. Ele não tem nenhuma característica destacada ou excentricidade como as outras personagens, serve somente para o autor se mostrar politicamente correto. Obviamente, isto não deve ocorrer de maneira proposital. Entretanto, é mais uma daquelas lacunas quase imperceptíveis, involuntárias e mesmo inocentes, em que percebemos que a problemática do racismo e da exclusão está muito longe de seu fim.
Cesar Henrique Guazelli.
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sobre cinema de ação, sobre amores e descobertas, sobre arte, sobre liberdades...
Não só descobrimos as liberdades que a Internet nos proporciona, como também fomos descobertos. Amanhã (22/11) será votado um projeto de lei que controla o acesso de todos os brasileiros à Internet. Foi lançada a enquete: e você? O que pensa sobre isso?
“O que eu espero, companheiros, é que depois de um longo período de discussão, todos concordem comigo!” Winston Churchill
P.S: Gostaríamos de parabenizar de maneira pública e solene, nosso colaborador Paulo Henrique dos Santos, pela exibição de seu primeiro documentário, Além dos Outdoors!!! Um filho que finalmente nasceu e só tem a dar mais e mais frutos!!!
Projeto de lei no Senado prevê controle da Web brasileira
O Senado brasileiro discute na quarta-feira, em reunião da Comissão
de Constituição e Justiça, um projeto de lei que prevê o controle do
acesso à internet, a exemplo do que se pretende estabelecer na China,
um dos países que mais controla o uso da rede.
Conforme o projeto, cujo relator é o senador Eduardo Azeredo, do PSDB
de Minas Gerais, qualquer usuário precisaria se identificar quando
acessasse a internet ou qualquer outra aplicação como o acesso a e-
mail ou a criação de blogs.
Dessa forma seria possível monitorar precisamente o que cada usuário
faz quando está online, sabendo que sites visita ou que tipo de
arquivos está baixando da rede, como músicas ou filmes.
Além de extinguir a privacidade, o projeto prevê fazer do acesso não
identificado crime passível de reclusão de dois a quatro anos.
Provedores de acesso ficariam responsáveis pela veracidade dos dados
cadastrais dos usuários e seriam sujeitos às mesmas penalidades.
Dados cadastrais
Para obter o acesso à internet, os usuários precisariam fornecer
dados pessoais comprovados como nome completo, endereço, número de
telefone, RG, e CPF aos provedores de acesso.
A favor do projeto estariam administradoras de cartões de crédito e
bancos. Procurada pela reportagem, no entanto, a assessoria de
comunicação da Febraban - Federação Brasileira dos Bancos, afirmou
que não irá comentar o projeto por enquanto.
Os provedores de internet são contrários à medida, que estabeleceria
um novo encargo burocrático para os provedores. Analistas também
criticaram a justificativa do projeto, de extinguir a privacidade dos
internautas brasileiros, já que suspeitos de crimes digitais podem
ser rastreados e identificados por meio do seu endereço IP (internet
protocol), número que é atribuído a cada usuário no momento em que
ele acessa a internet.
Agência Estado de Notícias
Discutamos, portanto, a noção de liberdade, de comunicação independente que colocamos em debate com a criação da Arca Mundo. Um dos maiores motivos pelo qual buscamos a Internet para a publicação de nossos pensamentos, foi, justamente, a não necessidade de patrocínios, financiamentos, ligações políticas, censuras, limites... É claro que essa ausência de limites é, ao mesmo tempo aliada a “causas” como a nossa e a pessoas que praticam crimes como rackers e pedófilos. Uma das grandes conseqüências inevitáveis do mal estar na civiliazação: tudo o que é novo, útil, acaba sendo subvertido de todas as formas, para todos os fins.
O fato é que os grandes monopólios de comunicação, aliados às formas de governo sempre tiveram o controle absoluto dos registros de informação, do que é colocado em pauta na sociedade, e agora, de alguma forma, isso está sendo corrompido, impedido. Longe de mim pintar as empresas eios im pintar como grandes viltoa todos os fins.como grandes vilãs ou colocar a culpa “no sistema”. Acontece, que um dos últimos meios livres, novamente, está na iminência do controle. É legal que seu sigilo telefônico ou bancário seja violado ou controlado diariamente? Por que seria legal, portanto, que seu acesso à Internet o seja? Deve-se, sim, procurar uma saída que evite os crimes cometidos via web, e todos sabem que não é essa necessariamente. Como na ditadura, as censuras foram estabelecidas para nos salvar da ameaça comunista, agora, querem nos controlar, para nos salvar da ameaça online. Sim, é um exemplo extremista, mas por que não sermos exagerados agora?imes cometidos via web, e todos sabem que ns do Mal Estar na Civiliazaraticam crimes como rackers e ped
Posso estar fazendo um alarme trivial, mas a maioria esmagadora da sociedade, simplesmente não sabe como o seu direito de comunicar e de receber informações é violado diariamente, sem que ninguém perceba. Alguém, alguma vez, pensou que poderia reclamar à Globo pela porcaria dos filmes ridículos e repetidos que passam, no mínimo, cinco vezes por ano em sua programação? Ou questionar por que os jogos de futebol são comprados para serem exibidos sempre depois da porcaria da novela das nove, fazendo com que você vá dormir de madrugada, se quiser comparecer ao estádio na quarta feira? Alguém se interessou ou buscou pesquisar qual seria o melhor plano de tv digital para a sociedade? Alguém se manifestou a favor do diploma para os jornalistas, quando queriam abolir sua necessidade para o exercício da profissão? As pessoas simplesmente acompanham passivamente o que acontece, sem ter a noção de que a cada dia são mais podadas e impedidas de se expressar!
Sejamos todos a favor de maneiras que impeçam atitudes criminosas, mas que não limitem mais esse meio de comunicação. Não sabemos no que isso vai dar, mas declaro aqui a minha indignação!
Do ser que se vê passional mas se faz cego aos apelos dos sonhos.
Engraçado como é indiferente seus atos falhos e seu pobre caráter
Frente a uma palavra que confessa a todos o que não precisa a mim dizer...
A mecha de cabelo que interrompe nossos olhares sinceros
Mente ao solidificar na ausência a espera de um sinal augusto:
Todas as mortalhas sabem que a minha busca é pelo que me abala
Nas gigantes manhãs em que nada se dá ao sol que o acordar de bem.
Sempre cri no talvez, o odiando mais que amar a quem se idealiza...
De alguém que, conscientemente nunca amou,
Forjado nesse mundo de esperas e de pestes loucas e verossímeis:
A minha quase inquietação se metadiza pois é vã na morte e na vida.
- O Casal Osterman, de Sam Peckinpah
- Bala na Cabeça, de John Woo
- Sonatine, de Takeshi Kitano
- Eleição, de Johnnie To
- Miami Vice, de Michael Mann
São cinco filmes em questão, e quatro deles giram em torno de um. Não por um motivo qualquer, O Casal Osterman de Sam Peckinpah, é o filme base para uma reflexão maior sobre o cinema de ação contemporâneo, pois é dele que vem a rica fonte de influências que se estruturaram para a criação desse gênero que hoje é cultuado por muitos, e tem cineastas de primeira linha como representantes. Peckinpah é mesmo o maestro da ação e da violência, por que ele simplesmente enxergou no registro cru e em slow motion da violência, uma vertente bem mais profunda, e que poderia dar ao gênero uma maior austeridade e possibilidade de reflexão do mundo em que vivemos bem maior do que o cinema vinha fazendo até então.
De Peckinpah passamos a John Woo, especificamente de sua fase chinesa em meados da década de oitenta. Woo surgia como a grande revelação do cinema de ação quando fez Money Talk em 1980, e depois dele, fez ao menos três filmes memoráveis como The Killer, Bala na Cabeça e A Outra Face. Fato é que a fase criativa de Woo termina, a partir do momento em que ele adere ao cinema de ação conservador americano, diluindo bastante a fórmula que fez dele um mestre na China. Em Bala na Cabeça, Woo reúne o estilo operístico de um Sergio Leone com a violência crua a lá Peckinpah, para criar uma sinfonia da brutalidade e da guerra, num filme que se as vezes se leva a sério (mas sempre nos momentos certos) em outras, injeta humor e ironia pra colocar o gênero da “ação” num patamar que vai além da simples diversão como nos filmes do Michael Bay, por exemplo. Um elogio ao espetáculo do caos, do sangue, da violência, mas nunca simplesmente da violência pela violência. Woo aqui, não soará gratuito. A violência brutal, é antes ferramenta para a não-violência, e em Bala na Cabeça, a idéia é exatamente essa.
Eis que surge então Sonatine, de Takeshi Kitano. Kitano não é um reciclador do cinema clássico de ação como bem foi John Woo. Ele opta por uma outra abordagem do gênero, abordagem essa que mais tarde irá se tornar a marca desse que é um dos grandes autores do cinema contemporâneo. Sonatine é o anti-filme-de-ação por excelência. Primeiro por que todos os códigos do gênero estão lá: tiroteios, explosões, pancadaria, humor, máfia, gangues e tudo mais. Mas Kitano opta pelo existencialismo antes de tudo. O minimalismo, o tempo, os pequenos momentos, são valorizados antes da ação. É ai que ele se aproxima de Peckinpah, pois ambos querem abordar o ser-humano antes de qualquer outra coisa, e a violência é apenas um reflexo, uma faísca. Mas se Peckinpah primava pelo balé, pelo espetáculo da violência, Kitano prima pela frieza. A violência aqui vem crua e simples, sem qualquer outro artifício. Mas Kitano faz com Sonatine – e também com seu próximo filme, Hana-bi – um filme de ação visceral e contemplativo. Uma gratificante obra-prima.
Voltando ao presente, hoje temos Johnnie To como o maior expoente desse gênero no cinema contemporâneo. To volta a levar a ação para o lado operístico da coisa, das lutas coreografadas, do sangue aos borbotões. Mas ele, unindo o que havia de melhor em Leone e Peckinpah, criou uma assinatura sua. Em Assassinos de Elite ele demonstra por exemplo, com a metalinguagem, de onde veio tudo o que conhecemos hoje sobre o cinema de ação. E aqui ele consegue trazer Sergio Leone de volta à vida com a orquestração perfeita da ação e da violência em seu filme. Desde o uso das gruas, das frases de efeito e tudo o mais. Mas To quer fazer um cinema só seu. É ai que ele chega então com Eleição. Filme de ação por excelência, Eleição retoma a idéia das pequenas ações, para um grande filme de ação. Lá não há a carnificina referencial de Assassinos de Elite, mas sim uma serenidade na colocação de violência
Retornamos então à América, criadora do cinema de ação, mas estagnada, presa em seus próprios signos do gênero. Hollywood que enriqueceu com o filão do cinema de ação que ela mesma criou, teve que importar os diretores orientais que renovavam o gênero pra se manter. Mas a grande revolução dentro do gênero veio de um americano nato: Michael Mann. Ele depois de filmes de ação mais clássicos como Fogo Contra Fogo, começa a partir de Colateral, uma experiência radical dentro do cinema de ação. Essa radicalização chega ao ápice
Interessante, vendo todos esses filmes, perceber a multiplicidade de formas e possibilidades que se tem dentro do cinema, mais ainda dentro de um gênero como o da ação. Isso por que ainda deixei de fora cineastas fortes e relevantes como Tsui Hark, Willian Friedkin, Bong-Joon Ho e Andrew Lau. O cinema de ação prova assim que pode-se sim ser contundente e profundo, pode-se questionar a imagem, o cinema, o homem, todos eles em contato direto com a mais primitiva das leis da natureza: a violência.
No meu último texto eu fiz um desabafo sobre o como é ruim se sentir apenas mais um homem mediano no mundo. E concluí dizendo que estava tomando providências para que as coisas mudassem. Para minha alegria, ontem a noite tive indícios que estou seguindo o caminho certo.
Na exibição pública do “Além dos Outdoors”, meu primeiro documentário, tive uma prova concreta de que as coisas estão mudando. Deixei de ser um simples espectador para estar no centro das atenções. E devo confessar que isso nunca havia me acontecido antes. Falando em termos cinematográficos, deixei de ser um mero figurante pra me tornar um dos protagonistas.
Produzir esse filme foi um dos maiores presentes desse ano. Por causa dele eu deixei um emprego cômodo, mas desinteressante, conheci gente que nunca imaginava conhecer e tive a oportunidade de aprofundar laços com outras que eu já conhecia, mas que por puro preconceito e ignorância não tinha grandes vínculos. Esse filme me abriu a mente em diversos aspectos.
Para quem está acostumado com aplaudir, receber palmas é estranho. Fica a dúvida se aquelas palmas são sinceras ou puros gestos mecânicos que a boa educação preza. O mesmo acontece com a infinidade dos sorrisos recebidos. Se pelo menos 10% forem sinceros já fico feliz.
Em nenhum momento da minha vida eu me senti tão observado. Minha auto-estima também nunca esteve tão boa. Mesmo assim, ainda não foi possível levantar a cabeça pra encarar as centenas de olhares e nem falar o discurso que já estava pronto há anos na cabeça. Pra não passar uma vergonha ainda maior, é melhor falar pouco e coisas básicas, mesmo que fúteis.
É estranho se sentir querido. É estranho ver que pessoas deslocaram um pouco a rota de seus dias para poder lhe prestigiar. No fundo eu ainda acho que não mereço isso. No fundo eu ainda acho que eu sou uma fraude e que posso provar esse fato. Admito que pensei que aquele momento acabaria assim que as luzes do cinema fossem acesas. Mas quando sua rotina é marcada por pessoas especiais, a sensação se prolonga um pouco e vai até uma mesa de pit-dog. Isso tudo são resquícios de um homem que ainda não decidiu que rumo tomar.
Paulo Henrique dos Santos.
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Naquela manhã de sábado eu podia sentir o calor... do sol que estourava no céu e de algumas pinturas em seu aconchegante atelier. Quando entrei naquele cômodo ajeitado por ele, já avistei um montante de trabalhos. Alguns, envelhecidos pelo tempo, carregados de pó. Outros, com cuidado, ele envolveu em um fino plástico com o intuito de conservá-los. Um em especial trazia as seguintes palavras: “depois de lerem esta história, vocês terão de concordar que o destino das pessoas já vem traçado antes mesmo de nascer ou, até mesmo, antes que alguém tenha sonhado com a existência de tal ser”. Eu podia até não comungar da idéia, mas tinha que admitir a profusão de texto e imagem.
Tudo estava numa desordem exata, que o localizava com rapidez em meio aos papéis, pincéis, tintas, luvas, telas vazias, todas ansiosas pelo seu toque. Caminhei um pouco mais e de repente tive um embate com um enorme quadro. A pintura era tão sinestésica que qualquer pessoa teria gosto em tocá-la. Parecia veludo, mas não tinha aparência muito suave.
Ele insistia em me ver à vontade. E eu estava. Tanto que comecei a vasculhar cd’s e dvd’s deixados em cima de um balcão. Encontrei uma discografia dos Beatles e outros achados. Ali também estavam filmes de Almodóvar, Bergman, alguns do neo-realismo italiano e, o mais incrível, X-Men – O Confronto Final! É claro que era fascinante.
Encontrei esculturas, telas retocadas de dois em dois anos. Havia três desenhos recentes que, segundo ele, envolviam toques concretistas, dadaístas e outras tendências, ambas misturadas com a sua maneira lúdica de fazer o que mais ama. Era mesmo um meninão. Se atrevia a fotografar com Nikon. Usava tripé. Não ficou pra trás na era digital. Ele sabia operar fotoshop e coreldraw!
Não havia dúvidas. Tentava fazer de tudo. Em linguagem mais apurada, alguns conhecedores o chamaram de versátil. E era de fato. Aproveitei aquele sábado de uma maneira diferente. Queria ver, sentir o gosto estético que o lugar exalava. Estranho, não é mesmo?!
Diante de mim, se apresentava um artista tímido, mas que no fundo queria ser visto através de sua arte, de seu trabalho. Na verdade, acho que não queria fama pra hoje ou pra amanhã. Ele certamente fazia tudo porque não conseguia deixar de se movimentar diante das coisas da vida. Tinha muita sensibilidade pra isso. Sua arte é do aqui – e – agora, entretanto não se contenta em ser efêmera. Prova disso é que nem por um segundo pude me desfazer daquele ambiente, das suas telas, dos seus desenhos-esculturas, 1031, 1031... Nesse número estava alguém desenhado antes mesmo de nascer! Aí não podia mesmo ser diferente, eu confesso!
Maraísa Lima.
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