Mel Gibson pode ser acusado de anti-semitismo, de bebedeiras e problemas com a polícia, de seu machismo, arrogância, mas o que nos interessa aqui é a figura do cineasta que ele vem criando desde seu primeiro filme o Homem sem Face de 1993. Sim, por que ele, com esse Apocalypto demonstra que é mesmo um autor de cinema interessado em ter uma estética, uma maneira pessoal de coordenar elementos (no caso, fílmicos) para apresentação de um assunto e a maneira que ele irá abordá-lo.
É intrigante analisar que Gibson coloca todos os seus protagonistas no limite do sofrimento físico, da violência, da carne e do sangue, do martírio provocado por seus oponentes e de sua redenção final. Foi assim em O Homem Sem Face, Coração Valente, A Paixão de Cristo e agora em Apocalypto. Mesmo que morram (como o líder escocês de seu segundo longa ou como Jesus) seus personagens acabam por promover grandes conquistas, para si mesmos e/ou para os seus.
Se em A Paixão de Cristo esse percurso da violência já havia sido levado ao extremo ao mostrar o corpo de Cristo sendo dilacerado, aqui em Apocalypto, ele parece querer levar esse espetáculo adiante. Vejamos, Jaguar Paw, jovem maia que é capturado junto com sua tribo pelos Incas para serem oferecidos como sacrifício aos Deuses, deixando sua mulher e filho para trás. Ao fugir inicia-se uma sangrenta caçada em que ele sofrerá intensas agressões físicas a fim de resgatar sua família. O mais interessante porém, é que todo esse percurso de violência percorrido por Jaguar Paw parece justificar a operação-assinatura estética de Gibson, o uso da câmera lenta, a violência gráfica...
Gibson filma no gerúndio: ele quer o movimento na dimensão do "movimentando", como se o martírio estivesse sempre em curso, nunca concluído, como a história da tartaruga de Arquimedes, que nunca chegará ao final da corrida. Dessa forma ele parece querer mostrar bem de perto as conseqüências desse martírio no corpo de seu protagonista (ou mesmo de seus algozes), com a violência sendo levada ao limite. Gibson investe na intensidade da dor como mecanismo para expectativa da ação, seja prolongando o martírio de Jaguar Paw até o final, seja violentando todos os outros personagens do filme até que ele se conclua.
Mais interessante porém é o domínio que Mel Gibson adquiriu ao longo do tempo de sua misé-en-scéne. Basta analisarmos a primeira cena do filme. Por um momento me vi dentro de alguma obra do tailandês Apichatpong Wheerasethakul (ou Joe como é chamado, diretor de Tropical Malady, Eternamente Sua e Sídromes e um Século) suas profundas imersões dentro de florestas e seu uso efusivo do verde. No caso de Apocalypto, a primeira cena se parece bastante com uma imerssão do tailandês e seu Síndromes e um Séculos, com a diferença de que daquele verde surgirá uma anta que será caçada até seu final violentamente trágico. Gibson articula seus componentes fílmicos de maneira brilhante, consciente de que tem nas mãos um material que pode lhe render imagens magníficas, seja dentro das florestas densas da América do século 16, seja nas impressionantes cenas dentro da cidade Inca. Detalhe importante de que assim como Joe, Gibson filma tudo em digital, e o resultado é sempre impressionante.
Curioso ainda perceber que Apocalypto é claramente um filme de gênero. Comparações à Mad Max e Duro de Matar não são atôa. Com um senso de velocidade impecável, Gibson consegue construir apartir de tantos clichês do gênero, um filme que não se parece com nada, mas que é claramente filho remixado dos filmes de ação hollywoodianos, temperados com o tema família e com a já tão comentada ultra-violência. Ou seja, Apocalypto é um filme para a família, mas cruelmente feito para deixar essa família com os olhos arregalados, ainda que essa instituição saia ilesa do cinema, com um belo sorriso no rosto.
Fica claro diante disso tudo que Gibson quis passar longe de um relato histórico e puramente documental sobre maias e incas. O cineasta gosta de trabalhar com gêneros. Seja no drama (O Homem sem Face), ou no épico de aventura (Coração Valente), seja no terror gore (A Paixão de Cristo), ou nesse último caso um filme de ação (Apocalypto). Assim ele se concentra em mostrar fora da ação, o modo de vida daquela civilização – o que me lembrou O Novo Mundo de Terrence Malick – como caçavam, como lutavam, como rezavam... e mesmo que aquilo não seja historicamente correto, me pareceu bastante crível. O que importa naquilo tudo é mesmo a ação e a forma com que Gibson irá registrar o corpo sendo perseguido e violentado. Apocalypto pode ainda nos trazer outras nuances sobre civilização, sobre essa sociedade contemporânea. Isso só ficará mais claro com futuras revisões. Na verdade o grande encantamento do filme é o de ele ser o filme de ação alucinante e tão bem arquitetado que é.
É intrigante analisar que Gibson coloca todos os seus protagonistas no limite do sofrimento físico, da violência, da carne e do sangue, do martírio provocado por seus oponentes e de sua redenção final. Foi assim em O Homem Sem Face, Coração Valente, A Paixão de Cristo e agora em Apocalypto. Mesmo que morram (como o líder escocês de seu segundo longa ou como Jesus) seus personagens acabam por promover grandes conquistas, para si mesmos e/ou para os seus.
Se em A Paixão de Cristo esse percurso da violência já havia sido levado ao extremo ao mostrar o corpo de Cristo sendo dilacerado, aqui em Apocalypto, ele parece querer levar esse espetáculo adiante. Vejamos, Jaguar Paw, jovem maia que é capturado junto com sua tribo pelos Incas para serem oferecidos como sacrifício aos Deuses, deixando sua mulher e filho para trás. Ao fugir inicia-se uma sangrenta caçada em que ele sofrerá intensas agressões físicas a fim de resgatar sua família. O mais interessante porém, é que todo esse percurso de violência percorrido por Jaguar Paw parece justificar a operação-assinatura estética de Gibson, o uso da câmera lenta, a violência gráfica...
Gibson filma no gerúndio: ele quer o movimento na dimensão do "movimentando", como se o martírio estivesse sempre em curso, nunca concluído, como a história da tartaruga de Arquimedes, que nunca chegará ao final da corrida. Dessa forma ele parece querer mostrar bem de perto as conseqüências desse martírio no corpo de seu protagonista (ou mesmo de seus algozes), com a violência sendo levada ao limite. Gibson investe na intensidade da dor como mecanismo para expectativa da ação, seja prolongando o martírio de Jaguar Paw até o final, seja violentando todos os outros personagens do filme até que ele se conclua.
Mais interessante porém é o domínio que Mel Gibson adquiriu ao longo do tempo de sua misé-en-scéne. Basta analisarmos a primeira cena do filme. Por um momento me vi dentro de alguma obra do tailandês Apichatpong Wheerasethakul (ou Joe como é chamado, diretor de Tropical Malady, Eternamente Sua e Sídromes e um Século) suas profundas imersões dentro de florestas e seu uso efusivo do verde. No caso de Apocalypto, a primeira cena se parece bastante com uma imerssão do tailandês e seu Síndromes e um Séculos, com a diferença de que daquele verde surgirá uma anta que será caçada até seu final violentamente trágico. Gibson articula seus componentes fílmicos de maneira brilhante, consciente de que tem nas mãos um material que pode lhe render imagens magníficas, seja dentro das florestas densas da América do século 16, seja nas impressionantes cenas dentro da cidade Inca. Detalhe importante de que assim como Joe, Gibson filma tudo em digital, e o resultado é sempre impressionante.
Curioso ainda perceber que Apocalypto é claramente um filme de gênero. Comparações à Mad Max e Duro de Matar não são atôa. Com um senso de velocidade impecável, Gibson consegue construir apartir de tantos clichês do gênero, um filme que não se parece com nada, mas que é claramente filho remixado dos filmes de ação hollywoodianos, temperados com o tema família e com a já tão comentada ultra-violência. Ou seja, Apocalypto é um filme para a família, mas cruelmente feito para deixar essa família com os olhos arregalados, ainda que essa instituição saia ilesa do cinema, com um belo sorriso no rosto.
Fica claro diante disso tudo que Gibson quis passar longe de um relato histórico e puramente documental sobre maias e incas. O cineasta gosta de trabalhar com gêneros. Seja no drama (O Homem sem Face), ou no épico de aventura (Coração Valente), seja no terror gore (A Paixão de Cristo), ou nesse último caso um filme de ação (Apocalypto). Assim ele se concentra em mostrar fora da ação, o modo de vida daquela civilização – o que me lembrou O Novo Mundo de Terrence Malick – como caçavam, como lutavam, como rezavam... e mesmo que aquilo não seja historicamente correto, me pareceu bastante crível. O que importa naquilo tudo é mesmo a ação e a forma com que Gibson irá registrar o corpo sendo perseguido e violentado. Apocalypto pode ainda nos trazer outras nuances sobre civilização, sobre essa sociedade contemporânea. Isso só ficará mais claro com futuras revisões. Na verdade o grande encantamento do filme é o de ele ser o filme de ação alucinante e tão bem arquitetado que é.
Rafael C. Parrode
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2 comentários:
Gostei muito do seu comentário Rafa.
Realmente é essa impressão e APOCALYPTO é um grande filme de ação, não importa se historicamente é correto ou não, mas uma excelente história contada.
CIVILIZAÇÃO MAIA. E NÃO INCA. E O FILME É CONFORME A HISTÓRIA MAIA, COM CRUELDADES, SACRIFICIOS E TERRORISMO COM TRIBOS LOCAIS, QUE USAVAM COMO ESCRAVOS, PARA OBTER SUAS SUNTUOSAS CONSTRUÇÕES.
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