Naquela manhã de sábado eu podia sentir o calor... do sol que estourava no céu e de algumas pinturas em seu aconchegante atelier. Quando entrei naquele cômodo ajeitado por ele, já avistei um montante de trabalhos. Alguns, envelhecidos pelo tempo, carregados de pó. Outros, com cuidado, ele envolveu em um fino plástico com o intuito de conservá-los. Um em especial trazia as seguintes palavras: “depois de lerem esta história, vocês terão de concordar que o destino das pessoas já vem traçado antes mesmo de nascer ou, até mesmo, antes que alguém tenha sonhado com a existência de tal ser”. Eu podia até não comungar da idéia, mas tinha que admitir a profusão de texto e imagem.
Tudo estava numa desordem exata, que o localizava com rapidez em meio aos papéis, pincéis, tintas, luvas, telas vazias, todas ansiosas pelo seu toque. Caminhei um pouco mais e de repente tive um embate com um enorme quadro. A pintura era tão sinestésica que qualquer pessoa teria gosto em tocá-la. Parecia veludo, mas não tinha aparência muito suave.
Ele insistia em me ver à vontade. E eu estava. Tanto que comecei a vasculhar cd’s e dvd’s deixados em cima de um balcão. Encontrei uma discografia dos Beatles e outros achados. Ali também estavam filmes de Almodóvar, Bergman, alguns do neo-realismo italiano e, o mais incrível, X-Men – O Confronto Final! É claro que era fascinante.
Encontrei esculturas, telas retocadas de dois em dois anos. Havia três desenhos recentes que, segundo ele, envolviam toques concretistas, dadaístas e outras tendências, ambas misturadas com a sua maneira lúdica de fazer o que mais ama. Era mesmo um meninão. Se atrevia a fotografar com Nikon. Usava tripé. Não ficou pra trás na era digital. Ele sabia operar fotoshop e coreldraw!
Não havia dúvidas. Tentava fazer de tudo. Em linguagem mais apurada, alguns conhecedores o chamaram de versátil. E era de fato. Aproveitei aquele sábado de uma maneira diferente. Queria ver, sentir o gosto estético que o lugar exalava. Estranho, não é mesmo?!
Diante de mim, se apresentava um artista tímido, mas que no fundo queria ser visto através de sua arte, de seu trabalho. Na verdade, acho que não queria fama pra hoje ou pra amanhã. Ele certamente fazia tudo porque não conseguia deixar de se movimentar diante das coisas da vida. Tinha muita sensibilidade pra isso. Sua arte é do aqui – e – agora, entretanto não se contenta em ser efêmera. Prova disso é que nem por um segundo pude me desfazer daquele ambiente, das suas telas, dos seus desenhos-esculturas, 1031, 1031... Nesse número estava alguém desenhado antes mesmo de nascer! Aí não podia mesmo ser diferente, eu confesso!
Maraísa Lima.
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